Resenha do Conto A VIDA DE OLAVO, de Ana Cardeal
Capa: Carla Rodrigues da Cruz
SOBRE O EFÊMERO DO SONHO, DA VIDA E DA MORTE
por Nic Cardeal
No conto A VIDA DE OLAVO (edição da autora, setembro/2019), ANA CARDEAL escreve sobre a efemeridade da vida, sobre o processo de morrer, de sonhar, de partir e/ou retornar, narrando a vida do personagem Olavo. Toda a trama se dá em um 'espaço' de tempo, que ora parece tão mínimo, ora se estende na amplidão do infinito, como se a Olavo tivesse sido concedida a primazia do navegar entre mundos, do real ao imaginário.
Quem é Olavo? Um ser de asas, inquietante, pulsante, vibrante. Enquanto leio, às vezes penso que Olavo seja um vagalume, pois que sua existência, por si só, ilumina toda a história. Outras vezes, percebo-o como um grilo, um gafanhoto - ou seria um besouro? Outras, ainda, chego a imaginá-lo como uma libélula, que voa silenciosamente sobre as águas, das literais às metafóricas, das terrenas às metafísicas, das águas de fora às águas internas, das serenas às turbulentas, de todas as águas de que é feito o viver nos mundos. Sim, nos mundos, pois Olavo é um ser que transita entre os mundos. Quantos mundos? De início, Olavo parece viver em um canteiro de 'tulsit', seu alimento favorito (tulsit ou tulsi, espécie de manjericão sagrado, de folhas lilases e suculentas, originário da Índia). Mas ele não é um ser preso aos limites da realidade concreta, ele navega facilmente pelos mundos ilusórios, ou pelas fantasias da sua imaginação [ou da imaginação de outrem?], seja em desertos ou paraísos repletos de tulsits. As viagens de Olavo são constantes, como nossa grande viagem - às vezes tão curta e fugaz! - pela vida terrena.
Olavo é um autêntico peregrino dos diversos mundos. É assim que a autora descreve a vida desse incrível ser: "(...) Olavo tinha que decidir entre estar ali de novo ou seguir de asas abertas para parar em qualquer lugar do mundo, do espaço, do cosmos. Ele sempre poderia ir para qualquer lugar, se quisesse. Qualquer. Ou para "lugar nenhum". Estar em "lugar nenhum" era uma sensação tão profunda que ele não sabia sequer achar palavras que pudesse definir (...)" (pág. 17).
Em 'A vida de Olavo' é possível compreender, de forma simples, mas também surpreendente, que a efemeridade de todas as formas de vida é a maior virtude da Natureza. Tudo, de fato, está em constante transformação, evolução, mudança, tudo pulsa ciclicamente, em obediência a um [misterioso] 'princípio divino'. A sabedoria de Olavo fica evidente em seu comportamento diante da cadência dos eventos da Natureza. Ele, sempre atento, embora aparentemente 'distraído' - aos olhos humanos! - obedece a esses eventos (ou, melhor dizendo, às estações? - eu me pergunto -) e, assim, obtém do viver o melhor dos sonhos: a compreensão metafísica da vida: "(...) Mas ele sabia da impermanência de tudo, e das mutações escondidas em cada grão de areia, e daquilo que não poderia ser controlado, pois havia sempre uma força maior jogando os dados de um lado para outro. Era preciso ser humilde e seguir o fluxo (...)" (pág. 30).
Há um interessante ritmo na vida desse ser - e ele está justamente no fato de que Olavo vive entre 'dois tempos', ora permanece por bons períodos quase estático, asas recolhidas, transitando lentamente entre as folhas de tulsit, a alimentar-se do néctar de suas flores; ora parte em voos longínquos, numa espécie de mergulho profundo e inebriante pelo espaço vazio da liberdade. A história de Olavo é um inteiro pulsar de eventos cadenciados, na busca por compreensão do mundo. Sim, porque Olavo sabe que um dia irá partir, como tudo e todos os seres viventes. Por isso esse livro é sobre o aprendizado da vida, e da transição entre a vida e a morte. É sobre a realidade e a imaginação, o sono [sonho] e o despertar.
Afinal, quem é Olavo? Um vagalume, um grilo, um gafanhoto ou uma libélula? Um ser real ou morador do coração (sonho) de uma menina? Leia 'A vida de Olavo', você terá a(s) resposta(s) certa(s), ou mesmo aquelas que sua imaginação preferir optar! Porque há aqui a liberdade de escolha: você poderá encontrar esse ser mágico habitando seu coração, seus sonhos, ou até mesmo o seu canteiro de manjericão lilás no beiral que se abre da sua janela em direção à amplidão: "(...) a alegria suprema, a alegria Divina, a alegria do Amor (...)" (pág. 166).
ANA (DINÁ) CARDEAL, natural de Brusque/SC, reside atualmente em Viamão/RS.
É fisioterapeuta com especialização em Acupuntura, e professora em cursos de Yoga e de Fisioterapia.
Também é autora de 'Música Outonissa', livro artesanal lançado em Curitiba/PR (1986); e participante da 'Antologia do Varal Literário', organizada por Alcides Buss e publicada pela Editora da UFSC (1983).
Possui outros guardados em prosa e verso a serem publicados.
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