Uma crônica de Camila Marques Corrêa | "Novo normal, pra quem?"
Anrita1705. Fonte: pixabay.com |
Uma crônica de Camila Marques Corrêa
Novo normal, pra quem?
Pular as setes ondas no último
Réveillon me parece que não resolveu
muito, já que o ano de 2020 já começou com o pé esquerdo e a única onda que realmente teve algum efeito foi a da nova
tendência de máscaras para aquisição. “Qual usar hoje? Poá rosa? N-95?”, o
pretinho básico já não é mais pra dar aquela afinada na silhueta, e aquela
maquiagem cara, paga em algumas prestações, só nas selfies em algum cômodo
iluminado da casa.
Resenha agora só a dos blogs
literários e canais de cinéfilos. O novo
normal veio como a tendência das quatro estações e todo mundo pode ser um
estilista, não há restrições, desde que seja camada dupla de tecido. No nariz,
no queixo, presa em uma das orelhas, para algumas pessoas, as máscaras deveriam
vir com um manual ilustrado com um passo a passo, e em alguns casos, talvez
seja necessária ilustrações grandes e bem coloridas, só por precaução.
Aquela cervejinha gelada ainda
tá garantida, mas a próxima rodada agora é de quem irá lavar o banheiro durante
a semana. A pandemia não separa sexo de funções, a louça vai pra quem terminar
a comida por último – é isso ou entreter a criançada que agora tem tempo de
sobra pra treinar alpinismo nas cortinas e arte abstrata nas paredes que não
foram pintadas com tinta à base de água.
Para aqueles que sempre tinham
uma desculpa para furar aquele almoço de família, o isolamento pode ser uma
benção ou um calvário; a (des)culpa já não importa mais. Lembram daquela tia do
“e os namoradinhos?”, que você corria dela nas reuniões de família? Pois é.
Bateu uma saudadezinha, né? A pandemia revelou o que havia sido esquecido por
muitos dessa última geração: você até pode findar amizades, relacionamentos,
mas não há divórcio da família. Aquele arroz com feijão e lasanha de domingo é
o prato mais cobiçado pelos que agora passam o tempo na frente do microondas,
contando os minutos para aquele prato insosso ficar pronto.
Blusão, pijama e chinelo agora constituem o uniforme nas reuniões de trabalho, o som das teclas e do cooler dos computadores se juntam ao barulho do cachorro latindo, da Ana Maria Braga batendo no liquidificador um pão de minuto e aos gritos das crianças no quintal jogando bola em um espaço mínimo, mas que não diminui a energia da infância.
A pelada de domingo agora virou futebol de botão com o avô e partidas intermináveis de FIFA no Playstation 2...3...4… O projeto verão ficou na gaveta tomando o lugar daquela cinta que agora é acessório obrigatório. Fast foods são o novo à la carte, e o carboidrato tão evitado agora é a companhia fiel nos momentos em que a realidade vem à tona. Adedanha, jogo da velha, banco imobiliário; velhas brincadeiras deixadas de lado agora são a distração das famílias neste momento crítico.
Esse novo normal estipulado por alguns não é a adesão de todos. As
pessoas têm essa mania de generalizar como se todo mundo concordasse com a
ideia de que essa atual rotina é definitiva. Conviver com ela por sobrevivência
é diferente de aceitá-la como modo de vida permanente. O bom “novo normal”
aceitável será aquele que na pós-pandemia se mantiver firme, aquele que
mantiver a família reunida na mesa, o pai brincando com o filho e participando
da vida escolar nas pausas do trabalho, ouvir as histórias narradas pelos mais
velhos da família de como era a vida “antigamente”. Agora, se o velho “normal”
voltar, bem, então que pelo menos fique a lembrança de que alguns hábitos, os
bons hábitos, foram tendência e que podem fazer parte do próximo catálogo.
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