MulherArte Resenhas 04 | O balanço poético em "Asas do inaudível em luzes de vagalumes" (2020) de Maria Elizabete Nascimento de Oliveira

 



O BALANÇO POÉTICO EM ASAS DO INAUDÍVEL EM LUZES DE VAGA-LUME (2020), DE MARIA ELIZABETE NASCIMENTO DE OLIVEIRA: LIBERDADE E IMENSIDÃO


- Por Jocineide Catarina Maciel de Souza

 

Se a escrita é libertadora, a leitura precisa encantar e fazer pensar, por isso está tão perigoso aprender a ler, especialmente se considerarmos o contexto sociocultural e político em que vivemos. Ao anunciar a publicação de Asas do Inaudível em luzes de vaga-lume (2020), Maria Elizabete do Nascimento de Oliveira se justifica: - eu precisava escrever poesia para não ser sucumbida pelas agruras da escrita científica. Bendita tese que nos agraciou com a oportunidade de ler os belos e reflexivos poemas que compõem essa obra.

Na necessidade de nomear nossas ações vamos considerar esse texto apenas como apreciação, pelo fato de não me deter a análise, mas escrever sobre aquilo que me apraz. Ao receber o livro o primeiro impacto é jogo de cores na tonalidade amarela marcada por gotículas de chuva que por si nos faz rememorar, pois vem acompanhada de elementos da natureza que dá a sensação de liberdade e imensidão, com a imagem do balanço que convida a abrir o livro e se deixar embalar pelas lembranças.

Em cada detalhe da construção da obra, a literatura flui com leveza e naturalidade. Desde o poema O silêncio, presente na orelha do livro, que mais nos parece o formato de um vaso aberto às contribuições do leitor, passando para a apresentação feita por alguém que sabe como é essa dádiva de escrever poesia, a poeta Luciene Carvalho, que em uma noite de lua cheia no inverno cuiabano de 2019, nos apresenta a professora Bete como a encantação do rio Paraguai.

Em AUTORIA o eu lírico grita: Há outras faces ocultas/ vivendo dentro de mim (p. 13 e 14). Esses dois versos sintetiza a ânsia da poeta que não se pode adjetivar apenas pela belezura de seus versos, mas é preciso folhear o livro para encontrarmos a LIBERDADE, de quem não está pressa e anseia por um FIM DE NOITE porque sabe que no amanhecer o BEM-TE-VI irá aparecer para quebrar O SILÊNCIO que por hora promove a CONSTRUÇÃO de um ser que não teme a renovação.

Se metapoesia/metapoema é usar o poema para explicar/falar sobre o próprio ato da criação poética. Para além do conceito, é possível afirmar que esse livro é uma metavida em que: ESQUECIMENTO; INCURSÃO; REMINISCÊNCIA; LENTE RARA; O PRESENTE; DESENCANTO; SOLIDÃO; SEM ROTINA; METAMORFOSE; DECOMPONHA; QUIMERA; A ÍRIS D’OLHO; APRENDIZ; SOLITÁRIA; BALANÇO; VOCÊ NÃO É, FOI e tantos outros poemas explicam a arte de viver imbricada nas feituras do cotidiano. Nos poemas relacionados encontramos algumas formas de falar da vida e das possibilidades de olhar pela janela.

Observamos que há dois poemas que se repetem, a princípio imaginamos ser erro de edição, porém ao se deleitar com as percepções da autora, chegamos à conclusão que a mudança de BEM TE VI para PASSARINHO pode querer dizer que embora possamos mudar o título, o passarinho será o mesmo; Já em ESQUECIMENTO, a alteração surge apenas no final e parece suscitar que embora possamos realizar mudanças na nossa trajetória de vida, não podemos esquecer das nossas raízes, pois são elas quem darão o toque original à nossa existência.

Há no conjunto de poemas selecionados um jogo em que os elementos da natureza contemplam e espelham as ânsias humanas e, ao mesmo tempo, convida-nos a olhar a LUA, VENDAVAL, FLOR-SEMENTE, PASSARINHO com os olhos de Bernardo, a personagem do querido poeta que escreveu em Mato Grosso, Manoel de Barros.

Dentre todos os quereres da poeta que seleciona e embala cada palavra transformando-as em poesia, encontramos em evidência a arte de viver, os desafios da escrita e, principalmente, a presença enigmática de múltiplas mulheres que se constroem e se reinventam em vários poemas. E, se me perguntares: Qual é seu poema favorito? Te respondo que são vários, mas em NASCIMENTO sempre penso que a amiga sou eu. Todavia, é no poema BRINCADEIRA que me sinto contemplada em todas as dimensões que ecoam dos versos que o compõe.

Caro leitor, é preciso adverti-lo que ler é um ato perigoso, entre os principais sintomas estão: o pensamento crítico, o autoconhecimento e o desenvolvimento cognitivo, elementos que poderão contribuir para construir suas próprias histórias e se reverberar em poesia. Ao entender literatura como sendo a arte da palavra, ou a palavra esteticamente trabalhada, convido-lhes a ler e apreciar cada verso dos poemas do livro Asas do Inaudível. Caso gostem de um delicioso cafezinho, poderão degustá-lo com poesia, posso afirmar que é um dos vícios da autora.





Jocineide Catarina Maciel de Souza é quilombola Pita Canudo, possui graduação em Letras (2009), Mestrado em Estudos Literários pela Universidade do Estado de Mato Grosso (2014) e cursa o Doutorado no PPGEL/UNEMAT (2021). Professora de língua portuguesa na Escola Estadual João Batista. Professora Bolsista UAB/UNEMAT. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Literatura Brasileira, atuando principalmente nos seguintes temas: literatura mato-grossense, historiografia literária, literatura e ensino, letramento literário e Estágio Supervisionado. É membra do Coletivo de Mulheres Negras de Cáceres/MT.


Maria Elizabete Nascimento de Oliveira é Doutora em Estudos Literários pela Universidade do Estado de Mato Grosso/UNEMAT. Atualmente, professora formadora da área de linguagens no Centro de Formação e Atualização dos Profissionais da Educação Básica/CEFAPRO – Cáceres/MT. Membro dos Projetos de Pesquisa: No Centro-Oeste da “MARGEM”: Cem Anos de Relações entre Cultura e Literatura em Mato Grosso (1916-2016), UNEMAT/Universidade do Estado de Mato Grosso; Poética contemporânea de autoria feminina do Norte, do Nordeste Centro-Oeste do Brasil - UNIR/Universidade de Rondônia. É autora de Asas do inaudível em luzes de vagalumes (Carlini & Caniato, 2020).



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