Preta em Traje Branco | Trinômio de Valéria Rufino
Um grito para Herzer
Tem um pássaro que canta
a liberdade em sua prisão.
Ele é lindo, e alguém
que não se conhece bem o tem.
Ele canta...
“Eu tô só, num canto”
No espelho, o alguém está se vendo,
Eu solta, pessoa, me vendo.
Então usam-me, se esbaldam.
Matam-me e se perdem
Ressuscitam-me, mostram-me e escondem-me
Deixam-me em pranto
e forçam-me a sorrir
No entanto, vestem-me ao sol, despem-me no frio.
Meu corpo vazio,
Sem desejo... no cio.
Nesse mundo sombrio,
que me leva ao delírio
do instante que passou.
E aquela vida que eu sonhei ontem
amanheceu morta.
Essa morte eterna da vida,
Vem castrando os meus sentidos,
Vem corroendo os meus gemidos.
Eu vou escorregando de mansinho,
Indo ao encontro radical.
À raiz do pilão, socada, moída,
Está o ser, a razão...
Da pessoa humana natural,
Da vida do ser individual.
Inspiração “A Queda para o alto”, a história de Sandra Mara Herzer
Coisas da vida I
Eu choro na noite,
e me encolho
embaixo dos cobertores...
Tá frio.
É inverno no coração.
Durante a manhã,
Andei pelas estradas semi desertas;
Pensava e despensava ao mesmo tempo;
Cantava no ritmo dos meus passos,
Andava, andava, andava...
Eu li poesia a noite passada,
E ri da alegria dos dias passados.
Eu tomei quentão no instante que passou,
Queimei minha garganta,
Sonhei com beijo de dragão.
Pensei que era calma a minha canção,
Mas, era podre angustiante,
O arroz azedou, a carne apodreceu.
O alimento servido na grande mesa está podre.
A vida fúnebre acordou com sono,
Eu tive um pesadelo
sonhei com as coisas da vida.
Calcei os chinelos,
Mas preferia andar descalça,
Pisei no cimento frio... concreto
Sentia cheiro de terra molhada
Molhei um vaso de plantas,
E a terra cheirou...
Cheirou forte demais...
Acho que a água estava contaminada;
A planta murchou.
Poeta
Sou um poeta a beira do abismo,
Negro desboto à luz de mercúrio.
Viril vampiro na madrugada,
Buscando o sangue
Nas ruas anêmicas
Dessa cidade sem compaixão.
Sou um poeta-solidão
Com o cigarro entre os dedos,
Queima meus olhos a fumaça.
Encharcado de angústia.
Sou um poeta
Que fuma desbragadamente,
Fumo dores e desespero,
Fumo todos os cigarros,
Cinzas espalhadas à minha volta.
Minhas cinzas,
Do corpo queimado,
O crânio fervente
Derrama uma calda vermelha...
Sou um poeta a beira do cais
Onde delírios e amores jazem
Sou um poeta
Navegando em busca de paz.
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