Preta em Traje Branco | Poética em Maiúsculas de Susana Malu Cordoba
Não se pede poesia como quem compra meia dúzia de pães na
padaria
Embora até o ato de comprar pães para quem saboreia a
insignificância de existir, é poesia
Não se pede poesia com a simplicidade de quem apaga as luzes
A escuridão tem seus mistérios, seus perigos e carrega
poesia
Não se pede poesia como quem entra em um avião e dorme no
trajeto
Para voar, se faz necessário abrir o relicário da infância,
só assim é poesia
Não se pede poesia como quem compra um saco de terra na
floricultura
Para se tocar a terra, é preciso estar livre, recolhido em
suas miudezas e entender que a terra de onde viemos é sagrada, tem sangue, glória e somos todos pequenas sementes de poesia.
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Intenções
São as intenções, que dilaceram as palavras que saem de minha boca.
Foi a intenção e seu liquido corrosivo, que derreteu as vogais do seu nome.
Todas as vezes que seu nome abriga minha boca
São as intenções que amiúdam e te espremem
São elas que me fazem querer rasgar as fronteiras que existem
entre meus lábios e seu corpo.
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Medo de ter amado de mais.
De ter amando de menos.
De partir e não ter descoberto o ponto certo do amor.
Medo de ter me tornado a desgraça
que não vê graça na sutileza de cultivar um pé de arruda
e vê-lo ser lentamente esfacelado por uma lagarta que sonha em voar
Medo de não me reconhecer sem as máscaras que me enfeitam
Medo de que o silêncio me abandone, antes mesmo do fim
Medo de não sentir o prata da lua, que tinge minha pele
Medo de partir ferida, abraçada por minhas certezas
Medo de ter minha carcaça descartada,
sem ao menos ter tido o prazer de ter me tornado flor um dia
Tenho tantos medos, que a morte por si só,
não me parece sinônimo de descanso,
e sim o princípio do castigo, para aqueles que não sabem:
se estão vivendo ou sobrevivendo.
Fico sempre apreensiva quando me pedem para ler um poema meu, Às vezes tenho medo que me peçam para ler aquele poema do qual perdi a intimidade, Doou vida a um poema, Mas sou incapaz de criá-lo, Meus poemas não têm nome, Nascem órfãos, Morro toda as vezes em que me é permitido parir, E renasço numa tentativa sôfrega de ser melhor que ontem, Renasço sem entender os desejos que outrora me foram refutados, Renasço mutilada das verdade que só cabiam em mim.
E tenho medo de que o desespero me tome por completo ao não conseguir identificar esse filho que me saiu das entranhas.
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