Preta em Traje Branco | Poética em Maiúsculas de Susana Malu Cordoba


Coluna 24

Estética em Maiúsculas de Susana Malu Cordoba



Não se pede poesia como quem compra meia dúzia de pães na padaria

Embora até o ato de comprar pães para quem saboreia a insignificância de existir, é poesia

Não se pede poesia com a simplicidade de quem apaga as luzes

A escuridão tem seus mistérios, seus perigos e carrega poesia

Não se pede poesia como quem entra em um avião e dorme no trajeto

Para voar, se faz necessário abrir o relicário da infância, só assim é poesia

Não se pede poesia como quem compra um saco de terra na floricultura

Para se tocar a terra, é preciso estar livre, recolhido em suas miudezas e entender que a terra de onde viemos é sagrada, tem sangue, glória e somos todos pequenas sementes de poesia.


********************

Intenções

 

São as intenções, que dilaceram as palavras que saem de minha boca.

Foi a intenção e seu liquido corrosivo, que derreteu as vogais do seu nome.

Todas as vezes que seu nome abriga minha boca

São as intenções que amiúdam e te espremem

São elas que me fazem querer rasgar as fronteiras que existem

entre meus lábios e seu corpo.


********************


Tenho medo de partir sem tê-lo afogado em minhas lágrimas.

Medo de ter amado de mais.

De ter amando de menos.

De partir e não ter descoberto o ponto certo do amor.

 

Medo de ter me tornado a desgraça

 que não vê graça na sutileza de cultivar um pé de arruda

 e vê-lo ser lentamente esfacelado por uma lagarta que sonha em voar


Medo de não me reconhecer sem as máscaras que me enfeitam

Medo de que o silêncio me abandone, antes mesmo do fim

Medo de não sentir o prata da lua, que tinge minha pele

 

Medo de partir ferida, abraçada por minhas certezas

Medo de ter minha carcaça descartada,

 sem ao menos ter tido o prazer de ter me tornado flor um dia


Tenho tantos medos, que a morte por si só,

 não me parece sinônimo de descanso,

 e sim o princípio do castigo, para aqueles que não sabem: 

se estão vivendo ou sobrevivendo.



********************

Fico sempre apreensiva quando me pedem para ler um poema meu, Às vezes tenho medo que me peçam para ler aquele  poema do qual  perdi a intimidade, Doou vida a um  poema, Mas sou incapaz de criá-lo, Meus poemas não têm nome, Nascem órfãos, Morro toda as vezes em que me é permitido parir, E renasço numa tentativa sôfrega de  ser melhor que ontem, Renasço sem entender os desejos que outrora  me foram refutados, Renasço mutilada das verdade que só cabiam em mim.

E tenho medo de que o desespero me tome por completo ao não conseguir identificar esse filho que me saiu das entranhas.


Imagem de Engin Akyurt por Pixabay


Susana Malu Cordoba. 32 anos, paulistana, moradora da Vila Brasilândia mais precisamente do bairro Jardim Elisa Maria. Formada em Recursos Humanos, é diretora sindical do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região. Através deste sindicato atua no núcleo da diversidade racial, é poeta e iniciou seu contato com a poesia através do Sarau Elo da Corrente em 2016, desde de então vem escrevendo pequenas prosas poéticas.




 

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