Pés Descalços 04 | A visita do papai Noel
A visita do papai Noel
O
barulho da chuva acorda a menina dentro de mim. Combino com o meu filho como
seria legal pendurarmos luzes nos pergolados e montarmos a árvore de natal. A
infância me toma por minutos, o suficiente para o resgate de mim mesma. Houve uma
vez em que senti o papai Noel.
Na rua
em que morava havia uma feira com todo tipo de alimentos e brinquedos. Quando
chegava perto do natal era mais linda ainda de se ver. O homem da cobra parecia
mais vivo, ciganos vendiam suas cores, variações de brinquedos, alimentos e
doces. Às vezes me imaginava com uma maçã nas mãos, ou um brinquedo.
Ao
longo da infância, passávamos por muitas necessidades e esperar por um
brinquedo era luxo, a vontade de permanecer em pé vinha em primeiro lugar. Nossos
pedidos para papai Noel não chegavam. Era comum faltar o gás e a barriga vazia
esperando o almoço calava a fome de brinquedos. Quem sabe por descuido, são
tantos pedidos para atender.
Mas um
deles, dos natais, quero dizer, foi diferente dos outros e lembro-me bem disso.
Acordei pela manhã com uma trilha sonora que trazia o rumor do vento, dos
pássaros, e quase me fazia voar. Eram vinte e quatro dias do mês de dezembro,
já estava armada a feira na rua de casa.
Enquanto
tomava água, observei moedas na mesa ao lado da geladeira. Não sei bem quanto
era o dinheiro. Mas sei que foi o suficiente para comprar duas broinhas de
polvilho que se vendiam na feira. A vontade de comê-las vinha de tempos atrás.
Desci a ladeira, até a casa da minha avó comendo as deliciosas broas. Nunca
mais provei tal iguaria.
Os pássaros
cantavam sua aleluia de natal, como se o papai Noel estivesse ali para me
presentear. Ao chegar na casa de vovó, ela abriu um sorriso sereno enquanto eu,
em devaneio, habitava um mundo de pássaros. De volta para casa, vejo a mãe
entristecida, olhando para o nada. Ela ficou nesse estado por um bom tempo.
A névoa
escura levou o papai Noel para bem longe dali. Senti o coração
comprimido escutando o balbucio dos pássaros. Mamãe estava juntando as moedas
para comprar o feijão para o almoço. Teríamos companhia para o arroz, não fosse
o sumiço das moedas com as quais comprei aquelas broinhas.
Sem titulo, 2021. Neide Silva
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