A PALAVRA POÉTICA DE ANA CARDEAL | Projeto 8M
8M (*)
Mulheres não apenas em março.
Mulheres em janeiro, fevereiro, maio.
Mulheres a rodo, sem rodeios nem receios.
Mulheres quem somos, quem queremos.
Mulheres que adoramos.
Mulheres de luta, de luto, de foto, de fato.
Mulheres reais, fantasias, eróticas, utópicas.
Mulheres de verdade, identidade, realidade.
Dias mulheres virão,
mulheres verão,
pra crer, pra valer!
(Nic Cardeal)
Conheça a palavra poética de ANA CARDEAL:
Hoje,
quero toada de festas
e a noite inteira para que
os sonhos alcancem a dança das borboletas.
E hoje também,
nessa outra face de mim,
existe força
e vida de novo nascendo.
O tempo sopra minha calça desbotada.
O vento me empurra para cima
dos degraus
que se tornam cada dia mais distantes,
mas continuo, mesmo assim.
Continuo
e sei que vou chegar até lá!
imagem do Pinterest
-*-
Com o chão
coberto de pó e silêncio
eu padeço a hora que o sol se põe
e tento acender a chama
que um dia deixou de queimar.
imagem do Pinterest
-*-
Dos pássaros
as asas são a vida
Dos homens
outros homens são o coração
-*-
Deixe-me levantar os olhos
em direção às outras paragens
que estão ao longe
como um recolhimento de mim
aos poucos transeuntes desta avenida escura.
Deixe-me levantar os olhos
em busca do que perdi pelo caminho
à procura do que até aqui não encontrei.
Deixe-me,
de olhos altos e coração quieto,
em direção à nova primavera que quer começar.
-*-
Cerrarei meus olhos
num tempo que chegará breve
e não calarei a voz
com as palavras
que nunca fiz por mim mesma
pois que sou como todos
pois que sou como sempre quis
parte da centelha viva de um ser humano.
-*-
FUSÃO
Se pudesse
ter teu coração
desenhado
sobre o meu
teria a vida
num duplo compasso.
-*-
TRANSPARÊNCIA
Debrucei-me
à beira d'água
para ver se lavavam
se levavam
de mim
tua presença.
Mas olhei ao fundo
com olhos de concha
e coração de sol
e entendi
que o sol n'água
não se dilui
é só luz
(se 'diluz').
-*-
ENCONTRO
Buscarás
todos os caminhos
mais amplos, eu sei.
E não encontrando nada
voltarás vazio de dor
triste do amor
quieto - silente - sem cor.
E terás chegado ao fim
como quem chega absoluto
à beira do mar
a molhar os pés.
Então,
vislumbrarás em ti
todos os caminhos
do oceano.
-*-
RETRATO
Juntei
palavras.
Uma a uma...
Colhi
flores.
Milhares...
Tomei nas mãos
todas as folhas
dos outonos que se passaram...
Tudo por ti.
Inaugurei
dentro de mim
as salas mais secretas
com tua presença.
No mais profundo
de mim
te coloquei.
Te fiz.
Te inventei.
Agora
teu desenho em mim
sou eu.
-*-
UNI(VERSO)
Não penses
que este que
te faz nascer
todos os dias
é teu Deus.
Mais teus
são todos os silêncios
todos os vazios
aí sim terás toda amplidão
dele em ti!
-*-
Já olhei tantas vezes
os meus olhos
refletidos no espelho
da tua face
que, te vendo assim,
com o coração
da alma que trago,
é que sinto
o quanto sou tu.
-*-
A VIDA DE OLAVO
"(...) Olavo tinha que decidir entre estar ali de novo ou seguir de asas abertas para parar em qualquer lugar do mundo, do espaço, do cosmos. Ele sempre poderia ir para qualquer lugar, se quisesse. Qualquer. Ou para "lugar nenhum". Estar em "lugar nenhum" era uma sensação tão profunda que ele não sabia sequer achar palavras que pudesse definir. Ele apenas estava. Era. Era e estava. Sentia-se indefinido. Sentia-se vazio. Mas também preenchido de tudo. Esta era uma sensação exata? Talvez apenas uma metáfora. Daquelas bem compridas e inexatas, mas daquelas que poderiam definir em alguma coisa o que era estar no nada ou em "lugar algum"! Mas suas asas estavam fechadas agora...
E assim ele sabia que ficaria por algum tempo ainda naquele momento. Somente poderia partir quando as asas se abrissem, e ele nunca sabia quando elas se abririam de novo. Era sempre um mistério.
Teria que ter um vento especial, umas folhas secas caindo do céu, uma nuvem branca com o desenho de um longo fio de cabelo e uma aranha tecendo sua teia quase que no meio daquela cerca alva que o separava do mundo. Seriam cadências de eventos, sempre repetitivos, sempre certeiros, sempre definidos. E assim ele poderia partir para qualquer lugar, e qualquer lugar poderia ser o "lugar nenhum". Qualquer lugar poderia ser um lugar fantástico, ou daqueles lugares chatos e pequenos. Não importava. Nada mais importava dentro daqueles olhos tão grandes e serenos. (...)"
(* excerto do livro A Vida de Olavo, pp. 17/19)
-*-
Se puder
Pendura a vida
Na janela da alma
E deixa secar
Todas as águas
Todos os banhos
Todas as ânsias
Todos os medos.
E nasce de novo!
-*-
(*) 8M: 8 de Março = Dia Internacional da Mulher: Projeto 'Homenagem a mulheres escritoras/artistas', iniciado em março/2021, por Nic Cardeal.
ANA DINÁ CARDEAL é natural de Brusque/SC, e atualmente reside em Viamão/RS. É graduada em Fisioterapia, possui especialização em Acupuntura, e foi professora em cursos de Yoga e de Fisioterapia.
Participante da Antologia do Varal Literário - Textos Escolhidos pelo Público (org. Alcides Buss, Florianópolis/SC: Editora da UFSC, 1983); autora de Música Outonissa (poesia, livro artesanal, Curitiba/PR, 1986) e do livro A Vida de Olavo (conto, edição da autora, Viamão/RS, 2019). Possui outros guardados em prosa e verso a serem publicados.
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