A POESIA MARCANTE DE MÔ RIBEIRO | PROJETO 8M
8M
Mulheres não apenas em março.
Mulheres em janeiro, fevereiro, maio.
Mulheres a rodo, sem rodeios nem receios.
Mulheres quem somos, quem queremos.
Mulheres que adoramos.
Mulheres de luta, de luto, de foto, de fato.
Mulheres reais, fantasias, eróticas, utópicas.
Mulheres de verdade, identidade, realidade.
Dias mulheres virão,
mulheres verão,
pra crer, pra valer!
(Nic Cardeal)
Hoje é dia de mergulhar na poesia marcante de MÔ RIBEIRO:
Eu vim ao mundo como figurante, mas capricho tanto que influencio no enredo e saio de cena sem ser notada.
A figurante perfeita.
(* poema extraído da Revista Mallarmargens, de 27/01/2018)
-*-
Eu chovi
mas já passou.
Ainda não atingi o
índice pluviométrico do
descanso mental.
(* poema extraído da Revista Mallarmargens, de 27/01/2018)
-*-
O que ela foi
Ficou carimbado:
Sombra móvel
No chão do tempo.
Há ventania agora.
O balanço
Porém
Tornou-se imóvel:
Estátua de sal
Ousou olhar para trás.
(* poema extraído da Revista Mallarmargens, de 27/01/2018)
-*-
FERRUGEM
Pernas devidamente aprumadas
Carne e pele vestidas de
armadura leve
Um sangue aqui
outro ali
Nem é hemorragia
Sangramento breve
E vamos firmes
com determinação
até que
ao sentir o cheiro de ferro
do sangue
e da parca armadura
o diabo nos carregue
(* poema do livro Paganíssima Trindade)
-*-
TEMPESTADE DE AREIA
Dor não se mede
Dor desnorteia
Desagrega o ser
que agoniza
mesmo sem morrer
Dor é falta de ar
Ventania que sufoca
Hiperventilação arenosa
Choro seco
de lágrimas secas
Dor
é tempestade de areia
é falta de brisa
daquela que
em vez de ferir
alisa
DITO
A poesia mistura
alhos com bugalhos
joio com trigo
E nos diz:
eu te digo mais do que pensas que falo
(* poema do livro Paganíssima Trindade)
-*-
PAGANÍSSIMA TRINDADE
Falo a partir do umbigo mas
quando peço: "fale, umbigo!"
ele se fecha
teimoso
falso profundo
nem sequer um centímetro de breu
Teme mostrar-se
o ele-eu
Quando o guardo sob tecidos
ele resolve escapar
e diz: "agora eu falo!"
No fundo de seu fundo
não quer calar sua-minha voz
Pensamento-voz-sem-timbre
Dedos escrevendo
Palavra grafada
Eis
nesta simultaneidade
minha Paganíssima Trindade
(* poema do livro Paganíssima Trindade)
-*-
INVERNO
A menina andava por um descampado
Olhava para a grama
rala como suas pernas
A menina ouviu um som indefinível
Olhou para as árvores
ralas como seus cabelos
A menina olhou e viu o alçar voo
de uma passarada
densa como sua cabeça
E aprendeu um novo som
E viu pela primeira vez
as cores do céu daquele fim de tarde
Era inverno
(* poema do livro Paganíssima Trindade)
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PÓ DE ESTRELA
Na mobilidade o tempo
caminha a passos largos
como os da velocidade da luz
aquela moça
não satisfeita com a finitude
de suas pernas
corre montada em pernas de pau
feitas de luz de estrelas
(* poema do livro Paganíssima Trindade)
-*-
MEMÓRIA
Faz-me falta o que eu não tive
mas que sei muito bem
É coisa que retive
na não memória
É coisa do que não veio
do que não vem
Distraída disfarço
a falta
o cansaço
Retraída
eu perco
esta dança
e o compasso
(* poema do livro Paganíssima Trindade)
-*-
(*) 8M: 8 de Março = Dia Internacional da Mulher: Projeto 'Homenagem a mulheres escritoras/artistas', iniciado em março/2021, por Nic Cardeal.
MÔNICA RIBEIRO é natural e residente de Belo Horizonte. Graduada em Arquitetura e escritora, possui poemas publicados em diversas revistas, tais como: 'Caliban', 'Desvario', 'Germina', 'Literatura & Fechadura', 'Mallarmargens', 'Mirada', 'Revista de Ouro', 'Ruído Manifesto'. Participou das antologias 'É Urgente o Amor' (Edições Vieira da Silva, Portugal/2017), e 'Antologia Ruínas' (Patuá/2020).
Publicou seu primeiro livro de poemas em 2020, intitulado Paganíssima Trindade, pela Editora Penalux.
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