SETE POEMAS DE MARIAM PESSAH | PROJETO 8M
8M (*)
Mulheres não apenas em março.
Mulheres em janeiro, fevereiro, maio.
Mulheres a rodo, sem rodeios nem receios.
Mulheres quem somos, quem queremos.
Mulheres que adoramos.
Mulheres de luta, de luto, de foto, de fato.
Mulheres reais, fantasias, eróticas, utópicas.
Mulheres de verdade, identidade, realidade.
Dias mulheres virão,
mulheres verão,
pra crer, pra valer!
(Nic Cardeal)
Mergulhe na poesia intensa, impactante, linda, de MARIAM PESSAH:
ELEGIA DE PEDRA
À memória de Alicia Berlatzky, mi madre
Fiquei cheia
de vazios,
de perguntas.
tuas mãos se mexendo na cozinha
guardavam- tiravam- cortavam. Cozinhavam.
E eu aí
sentada
falando sem querer
me queixando
daquele (teu) ritmo vertiginoso.
Já eras consciente da
finitude
da vida
dos dias
O tempo passou
e nele
te fuiste
O tempo como um trem de carga
como uma barca
O tempo foi passando
pesando
pisando
pousando
pulsando
e nele foste
vagarosa - mente - corpo
até deixar de compreender
de insistir
eu tentei me preparar
mas os dias
se escorregaram como o arroz entre os teus dedos.
cada doze de maio
um novo círculo,
tan vos...
e nem eras tão certinha
o yo
no llegué a conocerte
lo suficiente.
llegaste el 12 de mayo del 40
te fuiste el 12 de mayo del 04
fizeste um círculo perfeito
preenchendo de infinidade
a finitude
não te deixo uma flor
mas uma pedra
com o perfume da eternidade
(* poema publicado na Antologia de Poesias Mulherio das Letras e no livro Grito de mar)
-*-
puedo ver un camino
escribo con la urgencia de romper el silencio
fotografío con sed de imágenes
pienso lo prohibido
transito campos minados
llenos de alambrados
que nos
separan
que nos
dividen
con la intención de
reagruparnos.
BASTA de racismo, de sexismo, de tanto egoísmo.
transito campos minados
no pisados. pisados, sí.
hubo por suerte muchas
mujeres que han atravesado ya
estas verdes praderas.
puedo ver y sentir sus huellas
gracias a ellas, me siento acompañada
y con menos sed.
puedo ver un camino
nos veo a muchas
cientos, tal vez, miles.
(no sé contar mujeres, sé contar historias).
estamos abrazadas a los árboles,
comiendo manzanas,
bailando al sol.
agradeciéndole a la Pachamama esta vida que estamos retomando.
que nos estamos apropiando, que elegimos con conciencia habitar.
nos escucho cantar, fuerte.
¿y ustedes? ¿se están escuchando?, ¿pueden oír los tambores?"
(* poema publicado na coletânea Martes verde)
-*-
tenho uma língua e s t r a n g e i r a
porque sempre estou um pouco fora
um pouco rouca
um pouco rocha
um pouco oca
minha língua sempre é estrangeira
porque habito a ponte do mar
sem língua
sem nação
sem fronteira
eu decido que a minha língua não
seja mais estrangeira, mas passageira
as línguas marcam presença no espaço quando
as palavras se organizam e materializam
mas e quando
as próprias línguas
são deslinguadas?
deixam de estar alinhadas?
mar no nome
no sobrenome: passagem.
(* poema publicado no livro Grito de mar)
-*-
senhas
tantas senhas que me acenam
números passeiam por mim
sem me tocar
sem me coçar.
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estou in
sentindo-me out.
assisto à vida
hoje de manhã acordei
assim
assistindo a vida
sentada ao lado da janela
- não para, não te detém.
falei para o trem.
hoje só quero sentir.
é outra forma de existir.
(* poema publicado no livro Grito de mar)
-*-
toco a vida com palavras.
de manhã
visto-me de letra
durante o dia
trabalho com frases
e descanso entre períodos.
- espaço! - lembra uma menina.
certo. há que alimentar os silêncios.
(* poema publicado no livro Grito de mar)
-*-
para o poeta Fernando Pessoa
sua língua é a sua pátria.
o meu bilinguismo
é a ponte que atravessa fronteiras
uma linha de fuga
o meu refúgio
- subversivo -
minha ilha
- sem flores -
desprendida de um mundo de muros
o (meu) bilinguismo e eu
somos apátridas partidas
estamos em muitos lugares
sem rumo fixo
párias deste mundo
(* poema publicado no livro Grito de mar)
-*-
m a r i a n p e s s a h
m a r no nome
no sobrenome p a s s a g e m
e as raízes?
mar na ida
ondas que voltam
mar na ida
iam de volta
(* poema publicado no livro Grito de mar)
-*-
(*) 8M: 8 de Março = Dia Internacional da Mulher: Projeto 'Homenagem a mulheres escritoras/artistas', iniciado em março/2021, por Nic Cardeal.
MARIAM PESSAH é natural de Buenos Aires/Argentina, e reside no Brasil, em Porto Alegre/RS, desde 2001. É Tecnóloga em Escrita Criativa pela PUCRS. Fotojornalista com especialização em movimentos sociais. Organizadora do 'Sarau das Minas', que tem por objetivo visibilizar a escrita de autoria de mulheres. Coordena a 'Oficina de Escrita e Criatividade Feminista'. ARTivista-feminista, escritora - poeta, cronista, romancista, tradutora -, amante das letras. Participa de vários grupos de estudo, entre eles: 'Processo criativo na literatura brasileira contemporânea - influência da condição judaica' (coordenação de Luiz Antonio de Assis Brasil); 'Reservatório de experiências poéticas' (coordenação de Diego Grando); 'Limiares comparatistas e diásporas disciplinares: estudo de paisagens identitárias na contemporaneidade' (coordenação de Ricardo Barberena).
Livros publicados: Malena y el mar (romance, Colección Libertaria, 2005); Malena e il mare (romance, edição em italiano, Colección Libertaria, 2008); Em rebeldia - da bloga ao livro (artigos, projeto bilíngue em conjunto com Clarisse Castilhos, Colección Libertaria, 2009); Amor, placer, rabia y revolución; poemas, crónicas y otros escritos (poemas, crônicas e outros escritos, Colección Libertaria, 2012); Grito de mar (poesia, livro bilíngue, Porto Alegre/RS: Taverna, 2019); Meu último poema (poesia, Caravana/2023, em pré-venda).
Participação em antologias e coletâneas: Voces para Lilith: literatura contemporánea de temática lésbica en Sudamérica ('antologadoras' Melissa Ghezzi & Claudia Salazar, Estruendomudo); Desobedientes; Antologia de Poesias Mulherio das Letras (org. Vanessa Ratton, São Paulo/SP: Costelas Felinas, 2017); Moldes para oxigênio (org. Luiz Antônio de Assis Brasil, Luiza Mussnich, Mariana Moretti e FabrícioSilveira, Porto Alegre/RS: Editora Zouk, 2018); Contra-amor, poliamor, relaciones abiertas y sexo casual – reflexiones de lesbianas del Abya Yala (compiladora Norma Mogrovejo); Martes verde - poetas por el derecho a la aborto legal (Bárbara Elizabeth Alí... [et al], Buenos Aires/Argentina: Edición Federal, 2020); Porto Alegre em quarentena (poesia, e-book, org. Camilo Mattar Raabe e Diego Grando, Porto Alegre/RS: Editora Figura de Linguagem, 2020); O fim do presente (projeto 'O Tempo como verbo', catálogo de arte e livro de contos, org. Laura Cattani e Munir Klamt, Porto Alegre/RS: Editora Névoa, 2021); Planner 2021 – poemas metalinguísticos (poesia, curadoria de Ana Elisa Ribeiro, Belo Horizonte/MG: Impressões de Minas, 2021); entre outras.
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