A prova de piano - Crônica de Chris Herrmann em co-autoria com Roberta Gasparotto
Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 06
por Chris Herrmann
Antes de começar a história verdadeira que vivi na época da minha adolescência no Rio de janeiro, preciso falar do llindo projeto literário da escritora Roberta Gasparotto*. Chama-se: “diga-me uma história e eu conto sua memória“. Ela ouve/lê nossa história e reconta com suas próprias palavras. Um projeto lindo e bem original que me deixou honrada em ser uma das convidadas. Quem quiser participar é só entrar em contato com ela pelo messenger ou pelo e-mail:
* Roberta Gasparotto nasceu em Passo Fundo e mora atualmente em Brasília. Estudou Psicologia na UniCEUB.
Agora vamos à história:
A prova de piano
de Chris Herrmann, recontada por Roberta Gasparotto
Quase nem acreditei quando passei na prova de admissão para o Conservatório Brasileiro de Música. Afinal, estava concorrendo à cobiçadíssima vaga de bolsista integral. Apenas uma vaga, para centenas de jovens que sonhavam em estudar lá. A mensalidade do Conservatório era caríssima, bem além do que meus pais podiam pagar, de modo que, tanto eles, quanto eu, ficamos felicíssimos com a minha tão sonhada admissão. O que eu não esperava, era que minha professora fosse o cão encarnado. Isso mesmo que você leu. A mulher oscilava numa mistura de perversão e loucura. Vou, aqui, lhe contar o que sucedeu e você tire as suas próprias conclusões: durante as aulas, ela sempre foi muitíssimo exigente e como era bolsista, eu tinha o peso adicional de ter que me sair otimamente bem nas provas, para garantir a bolsa do ano seguinte. Chegou o dia da prova final e, como você imagina, eu estava bastante nervosa. Pra relaxar um pouco, enquanto não me chamavam, eu resolvi entrar em uma sala repleta de pianos e tocar um pouco. Não queria treinar. Apenas tirar um pouco da minha tensão, tocando uma melodia qualquer. Não era nada parecido com o que cairia na prova, muito pelo contrário. Naquele momento, eu estava tocando um rock'n roll. Que delícia, rock'n roll ao piano! Nessa hora, foi que aconteceu. Minha professora entrou na sala falando alto e fazendo um verdadeiro escarcéu. Disse que eu era uma irresponsável displicente, tocando aquela música profana. Veja bem: profana! O que eu posso te dizer é que a mulher saiu completamente dos trilhos. E eu? Atônita, parei de tocar no mesmo instante. Tentei explicar que não estava treinando, apenas relaxando. Interessante, escrevendo isso pra você, percebo que a irritei ainda mais. Rígida do jeito que ela era, deve ter achado um absurdo eu estar "relaxando" antes da prova. Deve ter pensado: "como essa bolsista se atreve?" Apesar disso, saí da prova com a sensação de dever cumprido. Sabia que tinha ido bem, e, com um pouco de sorte, o restante da banca me passaria, também. Quando acabei a prova, passei na casa de uns amigos e somente mais tarde fui pra casa. E, para minha surpresa, encontrei meus pais com uma super cara feia, dizendo que a tal professora passou por lá, avisando que eu havia me comportado muito mal e provavelmente não passaria na prova. Ela disse, ainda, que, por pena, havia me dado nota dez, pra eu ter alguma chance, remota, de passar. Ou seja, ainda bancou a santa pro lado dos meus pais, que ficaram extremamente decepcionados comigo. Passei todo o mês de dezembro assim, com meus pais nem olhando direito pra mim. Natal? Que Natal? "Nada de presentes, mocinha". Que dezembro infernal! Quando veio o início de janeiro, chegou pelos correios a carta do Conservatório, com as minhas notas. Havia tirado dez em tudo! T-U-D-O!
No ano seguinte, pra compensar o meu azar com a primeira professora, eu tive aulas com uma senhorinha adorável. E a (mal) dita professora? Sei lá. E nem quero saber. Nunca mais ouvi falar.
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