De epitáfios e pétalas flutuantes - Chris Herrmann

Arte de Luciane Valença


De epitáfios e pétalas - poemas e prosas poéticas de Chris Herrmann


Todos vamos morrer
de alguma coisa. 
Eu queria morrer
de poesia.





Contracapa

quando eu morrer
- se for de poesia -
não se esqueçam 
de virar a página!





Epitáfio I

enfim, a superlua
em alta resolução

Epitáfio II

Farfalhei leve entre as flores,
e levando a lembrança
de todos os meus amores,
vou sem pesar.

Epitáfio III

foi um Rio que (sempre)
passou em sua vida

apesar dos amares
a dividirem

apesar dos poemas
a afogarem

apesar dos pesares
a penas a levarem




Das Asas

antes do último suspiro,
ele rascunhou o epitáfio:

"aqui jaz apenas
um ser humano
como outro qualquer:
como um outro homem
como uma outra mulher"

seu companheiro mandou
acrescentar na lápide:

"tão humano que dá pena
que dá asas de saudade
que a saudade é tanta
que jaz não me cabe"




Reinspiração

Não sei de vidas passadas nem de futuras. Tampouco ou nada desta que me basta (embora, às vezes, nem me caiba). Mas se pudesse escolher a vida nova, que ela fosse diferente: um sopro de poesia do passado. Um ser de inspiração, porque nele moram eternidades. Como um canto de Cecília. Uma pedra de Drummond. Um sabiá de Barros. Um corvo de Poe. Uma tabacaria de Pessoa. Um catavento de Quintana. Uma prosa de Alencar. Uma rosa de Cartola




Crepúsculo II

havia
um calor
de saudade
naquelas
andanças

a menina
que queria
alcançar
as estrelas
caiu tarde
em mim

segui
saudando
a criança

rasguei
as cortinas
do crepúsculo

anoiteci
chovendo
em meus olhos




Dízimo

troco meu lugar no céu
por um inferno mais justo
pago o custo que for de viver
de matar ou morrer de rir
de renascer mil vezes
me comover com o arco-íris

sonhar com um templo melhor
um evento, um lugar, um amar
um dia que amanheça
livre de culpas e medos
de mim




Subversiva

cometeu seu ato
mais revolucionário
: amou até morrer

como se fosse
a última canção
de todos os versos

como se fosse
o primeiro poema
do seu eu deserto

como se fosse
o céu, a única ilha
da fantasia

como se fosse
o grito surdo da poesia
um compêndio

como se fosse o amor -e era- 
a única lira do universo
a tocar sob sua pele o silêncio




Semitons de cinza

quando eu morrer
te peço

não chore
as minhas cinzas

deixe esse trabalho
pro mar

se num canto qualquer
do oceano

a vida estiver de onda
eu rio



É o vento surgindo... 
pra levar as minhas mágoas 
e trazer você.


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