Maya Falks - Um conto comovente
imagem: pinterest |
Matias
por Maya Falks
A gente tinha a mania de pegar
aqueles panfletos de papel mais grosso que o pessoal joga no chão e fazer
aviãozinho. Era a única coisa que eu sabia fazer além de recitar meio alfabeto
arrotando.
O Matias não, ele tinha mais
habilidades, fazia barulho de peido com o sovaco e barquinho com os panfletos.
Nos dias de eleição a gente andava nas ruas recolhendo pilhas e pilhas de papel
com cara de candidato tratada nesses programas de computador. O Matias fazia
praticamente um porto
inteiro de barquinhos pra gente brincar nas poças quando chovia.
Um dia a dona Zuleide escorregou
num barquinho que encalhou na calçada dela e a gente esqueceu de buscar. O pai
do Matias ficou uma fera, bateu nele de cinta até sangrar, na nossa frente.
A dona Zuleide achou muito que
bom, e disse pra minha mãe que ela devia fazer o mesmo, que onde já se viu
mocinha de bermuda brincando de barco com os moleques. Eu levei anos pra
entender o que ela quis dizer com aquilo porque a mãe detestava essas frescuras
e continuou me deixando brincar com os meninos.
Menos com o Matias. A gente ouvia
lá de casa o Matias gritando e chorando. A mãe disse pro pai que queria chamar
a polícia mas o pai não deixou porque dizia que cada pai educa seu filho como
achar melhor.
Um dia, quando eu tava voltando
da escola, o pai do Matias saiu de casa algemado e o Matias saiu dentro de um
saco preto. Minha mãe chorou a noite toda e ficou vários dias sem falar com meu
pai.
Depois de uns meses, a mãe me
levou no cemitério pra deixar uma flor pro Matias. De cima da pedra de mármore,
perguntei pra ele que lição o pai dele tava tentando ensinar, mas ele nunca me
respondeu.
Maya
Falks nasceu Márcia, no dia mais frio de 1982. Começou a criar histórias aos 3
anos, ditando as narrativas à mãe. Escreveu seu primeiro romance aos 7 anos, o
segundo aos 10 e a primeira antologia poética aos 14, nenhum deles publicados.
Atualmente Maya é publicitária, jornalista, estudante de letras e autora dos
livros "Depois de Tudo", "Versos e Outras Insanidades",
"Histórias de Minha Morte" e "Poemas para ler no front".
Para 2020 está previsto o lançamento de “Santuário”.
Parabéns, Maya, querida!
ResponderExcluir✍️💗✍️
Muito obrigada! <3
ExcluirEmudecedor.
ResponderExcluirParabéns e abraço, Maya.
Comovente!
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