Resenha do livro de Márcia Maia, ONDE A MINHA ROLLEIFLEX?






A FOTOGRAFIA DA POESIA

por Nic Cardeal  


ONDE A MINHA ROLLEIFLEX? (Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2012) é um livro escrito por MÁRCIA MAIA, ganhador do 'Prêmio Eugênio Coimbra Junior - Poesia' (Recife, 2008), que reúne poemas que parecem fotografar, além da realidade, a própria imaginação da autora. De um texto suave, delicado, amoroso, mas também forte - também político - como bem diz Amador Ribeiro Neto, ao prefaciar a obra: "(...) Não é preciso um tratado de fotografia ou de astronomia lunar para alumbrar-se com a poesia concisa, miúda, delicada de Márcia Maia. Mas, ao mesmo tempo, poesia forte como um touro madrileno. O que a mão esquerda lhe ensinou, o poeta aprendeu com Miró. A mão direita já nascera picassiana (...)" (MAIA, 2012, p. 6).

Enquanto os olhos viajam pelas páginas, a mente inclusive é capaz de 'fotografar' os poemas de Márcia, tamanho o mergulho nas ondas dessa 'rolleiflex' imaginária! Imaginação que cavouca o sonho, mas também a realidade, trazendo à poesia as diversas nuances da leitura do mundo - como, por exemplo, no poema 'conceitual': "(...) as balas - (á)vidas de sangue/todas têm destino certo/mesmo quando se dizem perdidas" (MAIA, 2012, p. 12).

Nesse autêntico 'ensaio fotográfico' da palavra, a autora consegue poetizar desde o movimento, às vezes lento, às vezes desvairado, do tempo - "(...) os pássaros mais cedo se recolhem/e a breve quietude prenuncia/o instante que desata a tempestade" (poema 'em câmera lenta', 2012, p. 23) - até os passeios noturnos, velozes e sorrateiros, do gato - "sob o olhar do poeta/um gato atravessa a noite/sem metáfora" (poema 'madrugada', MAIA, 2012, p. 26).

Há também na palavra de Márcia aquele mergulho imprescindível nos caminhos/mundos de dentro, como se ela quisesse, como exímia cirurgiã da palavra, costurar em versos, avessos e reversos, a emoção que sempre nos atravessa o coração. Assim se percebe na 'quase fotografia física' do poema 'reflexo':

"o avesso de mim
não é espelho

tampouco um anti-eu
rondando tonto à minha volta

o avesso de mim é o tempo
passando indiferente às minhas costas"
(MAIA, 2012, p. 67)

A poesia de Márcia é assim. Instantâneos fotográficos da vida real e imaginária, do pensamento  que navega pelas águas internas, ora tempestuosas, ora em tranquilas marolas, até que seja fundamental a pergunta final: 'onde a minha rolleiflex?' Porque a liquidez dos tempos modernos, por mais que se tente, não consegue apreender a poesia: "(...) a câmera do celular capta do instante/o que é objetivo o que é cenário/não capta a poesia" (MAIA, 2012, p. 71).

E é também certo que, por trás da 'câmera' do olhar de cada leitor, ali também repousa, na tênue linha pronta ao deslumbramento, a paixão pela poesia! Porque "(...) a beleza em silêncio se basta"! (MAIA, 2012, p. 57).

Bem assim, porque é imensa a minha paixão pela palavra poética, por isso mesmo que recomendo muito a leitura (deliciosa) da poesia de Márcia Maia!




Pernambucana do Recife, MÁRCIA MAIA é médica e se aventura nos caminhos da poesia. Publicou Espelhos (2003), Um tolo desejo de azul (2003), Olhares/Miradas (2004), Em queda livre (2005), Cotidiana e Virtual geometria (2008), Sem amém (2011), e Onde a minha rolleiflex? (2012), além de participar de coletâneas no Brasil e em Portugal. É mãe de Felipe, Maria e Tiago e avó de Letícia, Manuela, Alice e Sofia.




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