A Poesia grandiosa de Rita Santana - seis poemas
Justyna Kopania |
Amanheceres
O dia nasceu em deslumbramentos!
Um céu de nuvens incandescentes
Desfilava ao Sol que nascia
O espetáculo do mundo.
Cumpre-se a Solidão das turmalinas
E a dispersão dos astros.
Em mim, a rebeldia da existência acontece:
Ergo-me esguia sobre o porvir.
Devasto - no fundo de mim - coragens e âncoras.
Precipito-me da cama desejando
Alegrias, dessas que iluminam as manhãs
E cintilam bandolins na alma.
Inundo meu território com indulgências.
Preparei as armas e os escudos
A fim de vencer os ritos cotidianos.
Para seguir é preciso mover os motores,
Lubrificar as engrenagens e girar a roda.
Fito o horizonte: tudo me alarma!
Fito os elos desfeitos: há licitude em tudo.
Aquarela
Tudo é perecível!
As Estações cavalgam sobre os dias,
Fazem dos sonhos seu pasto.
Exponho-me a cortes e mutilações,
Pois envelheço de luas, marés e melancolias.
As Estações cavalgam sobre os dias,
Fazem dos sonhos seu pasto.
Exponho-me a cortes e mutilações,
Pois envelheço de luas, marés e melancolias.
Devasto vimeiras, salgueiros e várzeas
A fim de te oferecer amplidões,
Pois não amarguro ao mundo minhas tristezas,
Pronuncio palavras de abundância e liquidez:
Nevoeiros, charcos, brumas e prados.
A fim de te oferecer amplidões,
Pois não amarguro ao mundo minhas tristezas,
Pronuncio palavras de abundância e liquidez:
Nevoeiros, charcos, brumas e prados.
Sei de muros e fronteiras!
Guardo lenços e avenças em meu alforje.
A felicidade foge-me, escapa-me!
O mundo negligencia a minha verve
Enquanto vermes me comem, conduzem-me
Molhada e íntegra -
Ao Templo da Morte!
Guardo lenços e avenças em meu alforje.
A felicidade foge-me, escapa-me!
O mundo negligencia a minha verve
Enquanto vermes me comem, conduzem-me
Molhada e íntegra -
Ao Templo da Morte!
Justyna kopania |
Aves Migratórias
Aves migratórias cruzam o céu,
Pascem sobre nossas restingas,
Ignoram nossos destinos
E o desatino dos homens de poder.
Voam, vãs, vulcânicas e livres.
Respingo sobre a tela o rubor dos adeuses.
Pascem sobre nossas restingas,
Ignoram nossos destinos
E o desatino dos homens de poder.
Voam, vãs, vulcânicas e livres.
Respingo sobre a tela o rubor dos adeuses.
Assim, mulheres e homens
Transitam imersos em diásporas.
Migram para estuários menos áridos,
Remam, rumo às esperanças.
Sequer sabem dos monstros marinhos
Que encontrarão.
Transitam imersos em diásporas.
Migram para estuários menos áridos,
Remam, rumo às esperanças.
Sequer sabem dos monstros marinhos
Que encontrarão.
Naufrágios e temores navegam
Nas marés do coração de quem parte.
Nuvens dramáticas deslizam sobre
O azul da imensidão.
Egon Schiele desponta nas telas.
Tudo é tempestade e frio nos deslocamentos.
É preciso partir para outras voragens,
Partir para novas guerras.
A arte tutela sonhos.
Nas marés do coração de quem parte.
Nuvens dramáticas deslizam sobre
O azul da imensidão.
Egon Schiele desponta nas telas.
Tudo é tempestade e frio nos deslocamentos.
É preciso partir para outras voragens,
Partir para novas guerras.
A arte tutela sonhos.
É preciso olhar nos olhos das grandes nações
Justyna Kopania |
Outono
É Outono!
Meu coração está velho
E o Mundo aporta em terras inóspitas.
Aconselho-me calar diante da Estação.
Não profano o deslumbramento amarelo dos dias.
Fotografo manhãs e não espero nada!
Meu coração está velho
E o Mundo aporta em terras inóspitas.
Aconselho-me calar diante da Estação.
Não profano o deslumbramento amarelo dos dias.
Fotografo manhãs e não espero nada!
Ágraphos amores permanecem inexistentes.
Não amo homem algum.
Não sofro.
Apenas fotografo manhãs.
O Outono é indiferente
Às correntes de ar
Que atravessam Oceanos.
Não amo homem algum.
Não sofro.
Apenas fotografo manhãs.
O Outono é indiferente
Às correntes de ar
Que atravessam Oceanos.
Desconhece a possibilidade de chuvas.
Ignora a representatividade de Maju, como garota do tempo.
Não está nem aí para as rugas, nem o ressecamento da pele,
A perda do útero, ovários, trompas, as infiltrações dos pulmões,
Nem para os amores que apodrecerão
Com a proximidade da Primavera.
Inspira eutanásias, suicídios, mortes prematuras
E um enrijecimento abrupto da Solidão.
Não há Poesia alguma em tudo isso!
Ignora a representatividade de Maju, como garota do tempo.
Não está nem aí para as rugas, nem o ressecamento da pele,
A perda do útero, ovários, trompas, as infiltrações dos pulmões,
Nem para os amores que apodrecerão
Com a proximidade da Primavera.
Inspira eutanásias, suicídios, mortes prematuras
E um enrijecimento abrupto da Solidão.
Não há Poesia alguma em tudo isso!
O Outono apenas oferece amanheceres mais severos
E eu os fotografo!
E eu os fotografo!
Viktorija Lapteva |
Marinha
Todos os dias,
Afundo as mãos em Oceanos,
Mergulho em enseadas e rios,
Em busca do Silêncio.
Entre juncos, musgos e algas,
Encontro-me com a Solidão.
Embarcações rubras dançam
Valsinhas à beira do cais.
Afundo as mãos em Oceanos,
Mergulho em enseadas e rios,
Em busca do Silêncio.
Entre juncos, musgos e algas,
Encontro-me com a Solidão.
Embarcações rubras dançam
Valsinhas à beira do cais.
Engano-me com a pacatez das ostras
Deitadas sobre o esquecimento.
Murmúrios sustam a letargia das Horas.
Deitadas sobre o esquecimento.
Murmúrios sustam a letargia das Horas.
As Deusas prevaricam informações,
Demoram-se sobre os corais que cobrem os barcos.
Busco, acintosamente, entre todos, a Ti!
Busco-te em meio aos operários de Tarsila.
Busco-te no arsenal de Rivera,
Enquanto distribuo armas aos rebeldes,
Enquanto, adrede, apaixono-me.
Demoram-se sobre os corais que cobrem os barcos.
Busco, acintosamente, entre todos, a Ti!
Busco-te em meio aos operários de Tarsila.
Busco-te no arsenal de Rivera,
Enquanto distribuo armas aos rebeldes,
Enquanto, adrede, apaixono-me.
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Autorretrato I
Sou uma Persona que o espelho não reflete!
Trago os olhos arregalados e a alma exposta.
Ainda de mãos dadas com a professora
Do jardim de infância,
Vera Varanda,
Sei que os desafios serão de imensidão e inteireza.
Assemelho-me aos manguezais de raízes expostas.
Rasgos cortam a minha pele em escarificações
Deixadas por ancestralidades que nunca emudecem em mim.
Logo, há escaras em minha memória que sonha.
Trago os olhos arregalados e a alma exposta.
Ainda de mãos dadas com a professora
Do jardim de infância,
Vera Varanda,
Sei que os desafios serão de imensidão e inteireza.
Assemelho-me aos manguezais de raízes expostas.
Rasgos cortam a minha pele em escarificações
Deixadas por ancestralidades que nunca emudecem em mim.
Logo, há escaras em minha memória que sonha.
Esfolo-me todos os dias a fim de penetrar verdades
Submersas em minha preta pele.
Descobrir quantas me habitam,
Quantas sobrevivem ao tirar das vendas,
Quantas resistem à queda do abismo,
Quantas ainda enfrentam Hidras,
Quantas me restam do que fui e do que sou.
Submersas em minha preta pele.
Descobrir quantas me habitam,
Quantas sobrevivem ao tirar das vendas,
Quantas resistem à queda do abismo,
Quantas ainda enfrentam Hidras,
Quantas me restam do que fui e do que sou.
Eis-me nua pelas ruas de Ilhéus,
Cruzando fronteiras da América Latina,
Perdida atravessando o Oceano Índico,
Onde cismo palavras e colho amores-perfeitos.
Sou uma Dália atordoada, desidratada.
Desbravo a vida e rumo em direção aos desagravos.
Nada acalma o meu desejo de construir Existência.
Estou aqui, entre óleos e aromas,
Testemunhei a morte das Orquídeas,
E a despedida do último Outono.
Moro numa clarabóia, lugar do imponderável.
Desintegro-me a cada Poema!
Cruzando fronteiras da América Latina,
Perdida atravessando o Oceano Índico,
Onde cismo palavras e colho amores-perfeitos.
Sou uma Dália atordoada, desidratada.
Desbravo a vida e rumo em direção aos desagravos.
Nada acalma o meu desejo de construir Existência.
Estou aqui, entre óleos e aromas,
Testemunhei a morte das Orquídeas,
E a despedida do último Outono.
Moro numa clarabóia, lugar do imponderável.
Desintegro-me a cada Poema!
*Poemas do livro Cortesanias
Rita Santana nasceu em Ilhéus. É atriz, escritora e professora. Em 2004 ganha o Braskem de Cultura e Arte para autores inéditos com o livro de contos Tramela. Em 2006, Tratado das Veias (poesia) é publicado pelo selo Letras da Bahia. Publica Alforrias (poesia) em 2012, pela Editus. Em 2019 publica Cortesanias (poesia), pela Caramurê, e participa do Festival Internacional de Poesia de Buenos Aires.
A poesia de Rita Santana incendeia o mundo! Lê_la é sempre despertar mais.
ResponderExcluirA revista fica mais forte com a sua presença. Parabéns, bjs.
Lita, obrigada, minha amiga, Poeta! Estou muito feliz com o cuidado da edição e por ver o trabalho, assim, divulgado. Um beijo! Lia me deu um presente!❤
ExcluirMeu abraço carinhoso, Rita!
ExcluirHá um ano tem sido uma leitura recorrente, pois seus versos pedem licença para serem ilustrados com imagens identicamente poéticas. A força criadora de seu Verbo, remete-nos à experíência e ao deleite de uma obra de arte genuína. Que a Poesia lhe inspire sempre.
ResponderExcluirJoão, querido, obrigada por sua atenção permanente aos meus poemas. Isso ajuda a prosseguir. Um beijo! Sigamos!
ExcluirA poesia de Rita é trator e guindaste - arrasa e edifica.
ResponderExcluirObrigada, meu Amor! A sua leitura sempre me será cara!
ExcluirOs poemas de Rita Santana me deixam com olhar deslumbrado, me distancio do instante presente, sinto esses versos desmontando tudo que sinto até agora. Obrigada querida por esse enlevo na alma.
ResponderExcluirObrigada, minha querida! Quanta beleza em suas palavras. Você me deixa feliz!
ExcluirAmei os poemas! 🤍
ResponderExcluirObrigada, Cris! Parabéns pelainiciativa revista, é linda!❤
ExcluirA poesia de Rita Santana sempre me emociona e inspira!
ResponderExcluirQuerida, Artista, muito obrigada! Um abraço!
ExcluirAmeii os poemas pró! São poemas encantadores que tocam a alma, palavras usadas com excelência 👏👏
ResponderExcluirMuito obrigada! Lamento nao ver o seu nome. Mas me alegra wue seja uma aluna, aluno, uma companheira (o) de aprendizagens.
ExcluirPoesia forte! Desbrava a existência.
ResponderExcluirPena não ver o seu nome, mas muito obrigada.
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