Para colocar poesia no seu fim de ano | Crônica de Adriana Aneli

 




Terminamos. Passamos pelas dores e pelos estímulos, doses da mesmíssima frequência e proporção. 2020 se vai ao longe.

Prolongamos nossa ansiedade por dias e dias, à sombra dos que tombaram. Seguimos em frente, nos despojando aos poucos  de sonhos descômodos nesta caminhada.

Entre o trabalho incessante e a pouca poesia da vida encarcerada, assistimos da janela aos que passam como se nada fosse – seus risos desafiadores da vida urgente, sobre nossos atônitos cuidados.

À distância,  tudo empalidece; perde-se a memória dos deslocamentos. O som de coisas reais se transmuta em notícia de rádio, documentário sobre placebos, as mutações, as vacinas.

Chegamos ao final, comemorando conquistas alheias. Ano de desapego e impaciência.

Ano de calar e esperar; reorganizar, reaproveitar, enxergar na repetição o movimento sutil da natureza: meus cabelos brancos, os brotos nas plantas, as flores renovadas.

2020 não foi ano perdido: revelou-se, em memes exaustivos, nossa pequenez diante de tudo. Agora nos cabe a escolha entre rir. Ou desistir.

Não chegarei a 2021 com o ânimo que 2020 anunciava; ratinha de laboratório, já sei dos corredores, sua ameaça e privação. Alguns de nós, os mais espertos, já chegaram ao queijo. Outros, como eu, estão adiados, no luto a gozar em dia e hora mais conveniente.

Agora tudo são fogos... o artificio.












Comentários

  1. Parabéns pela linda estreia como colaboradora na nossa Revista Ser MulherArte, Adriana. E ainda com essa belíssima crônica. Obrigada!

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    1. Querida Chris, obrigada por sempre criar espaços lindos para a literatura!

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  2. Bela crônica da Adriana, que conseguiu colocar poesia num ano tão triste!!!

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  3. Simmm ano de desapego e impaciência. Mas uma boa pitada de aprendizado. 😍

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