Seis poemas de Rizolete Fernandes | "Mulheres tecem o tempo"
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Seis poemas de Rizolete Fernandes
"Mulheres tecem o tempo"
MULTIFACE
a Elizabeth Nasser
Sou a loba
que amamenta o mundo
Sou a companheira
do operário moribundo
Sou o beija flor
do bico fecundo
Sou a pantera
que atrai num segundo
Sou a feiticeira
em magia me aprofundo
Sou a boêmia
do bar vagabundo
Sou a poeta
cuja palavra em você cala fundo
NULA HIPÓTESE
Descarte a alternativa
você sem mim
essa hipótese
é nula enfim
sua verdade crua
sou eu nua assim
ou
sua verdade nua
sou eu crua assim?
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AMEIXA
Regado à lágrima
seu beijo me sabe a sal
dado à mesa
é como se pimenta fosse
aos domingos
tem sabor de ameixa doce
Do livro Luas Nuas, UNA,
Natal-RN, 2006
TECELÃS
Mulheres tecem o tempo
no ir e vir, outras não
atinam com a matéria
que edifica destinos
Algumas carregam mundos
no ventre de amor os nutrem
com carinhosa energia
cosem futuros em segundos
De leves, umas quase voam
voam e detestam esquemas
desembaraçam problemas
da vida as dores coam
Misteriosas umas vão
dormir aconchego hoje
e quem sabe acordar ontem
em atemporal solidão
Canções de Abril, UNA, Natal
-2010
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CERTAS PALAVRAS
Arrependo-me com frequência
de certas palavras ter
pronunciado
outras vezes o desgosto
é por não as ter falado
doe-me porém a consciência
de muitas outras palavras
jamais haver formulado
Vento da Tarde, Sarau das Letras,
Mossoró-RN, 2013
TROPELIAS DE VERÃO
no fiel idioma do coração de quem o lesse
Um poema que falasse de coisas meras da vida
simples e sucintamente mas que emocionasse
Que a infância vivida no sertão, ao evocar
cheiro de terra e capim espraiasse no ar
Que fizesse chorar por recordações antigas
os primeiros namorados as velhas amigas
Que aquietasse crianças no seu bulício diário
nos velhinhos reavivasse o vigor incendiário
Por bêbados fosse gritado nas ruas em noite fria
os deserdados aquecesse com o calor da poesia
Renovasse a confiança nos sem amor e sem credo
fulgurasse sonho pátrio no que vive em degredo
Que levado a conhecer ao político pragmático
presto ganhasse status de um lema programático
Que lido na abertura da assembleia da ONU
eliminasse as guerras que ceifam vida ao homem
Esse poema seria tecido em raios de luar
servido em taças de versos a fim de anunciar
Em cada estrofe a paz, tão logo alvorecesse
em cada verso o amor, assim que anoitecesse
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Ah, se Érato me presenteasse verve assim
ao invés, tropelias de verão, ai de mim!
Inédito em livro. Publicado na Revista da Academia Norte-rio-grandense de Letras, edição nº 61, out-dez de 2019.
Rizolete Fernandes é do RN e
reside em Natal. Formada em Ciências Sociais pela UFRN, militante dos
movimentos sociais, feminista e poeta. Publicou seis livros, entre eles Luas
Nuas (Una, 2006), Vento da Tarde e Tecelãs (Sarau das Letras/Trilce Ediciones,
2013 e 2017) de poesia, os dois últimos traduzidos para o espanhol. Participa
de dezenas de coletâneas no RN, Brasil e Espanha. Integra a UBE-RN, o ICOP –
Instituto Cultural do Oeste Potiguar e o Mulherio das Letras, através dos grupos
locais Nísia Floresta e Zila Mamede.
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