Sobre as De(s)morte(s) de Nima Spigolon
Há o tempo de festa. Há o tempo
de recolhimento, este, em que agora nos abrigamos da doença e da morte. Tempo
de adiar encontros e rostos – sorrisos e esgares se perdem no luto das máscaras,
sem testemunha. Nunca estivemos tão sós.
Às vezes,
dói
respirar
De outras,
Impossível ir tão fundo.
Sorvemos com dificuldade o dia
que se arrasta. O ar, após este ano e o outro, se rarefaz. O vácuo é nas
emoções, as minhas e as suas, transformando nossos corpos em ausência. O que
somos, sem a referência do outro?
O silêncio está nos seus poemas,
que ora leio como um sussurro. A vida se desmancha em seus versos: é preciso
dissolver-se na incerteza e na desesperança para então nos reconstruir. O fim é
sempre o começo? como a inviabilidade da fruta desperta a possibilidade da
semente.
O ser adiado e dolorido de seus
versos me desperta, e, como ele, logo torno-me (im)paciente nestas manhãs que
se arrastam. En passant, aos poucos, ele e eu reunimos ânimo para
desafiar nosso destino de solidão compartilhada: troco sonhos novos ou
realizados.
Então nos perguntamos: como
sobreviver até a primavera?
A confusão entre a lembrança e o
desejo leva sua poesia ao extremo: tudo
parece longe demais, escuro demais...
... não sei
o que fazer
com os ecos
números e nomes
dos outros corpos
no meu corpo.
Na poesia de abismo, o mergulho
profundo é também início de voo. A dor, agora, aponta a direção da volta. São as
de(s)morte(s) e as compreendo bem, enquanto a voz lírica ganha inédito tom de
ninar:
Ó meu amor
dorme à noite
canto o sonho
dia dias afora
A reconciliação com a humanidade acontece.
O que sobreviveu a custo nesta quarentena se fortalece na sua poesia; esqueço o
mórbido e o medo quando ela diz: tempo de emancipar no templo do
dissipar. Já podemos sair?
Ainda não. Nova morte e já são
tantas... Há dor lá fora. Há dor nos
poemas. Aqui dentro tudo parece inalterado.
Adriana Aneli
Nima Spigolom é professora! Doutora em Educação,
área de concentração Ciências Sociais na Educação pela Universidade Estadual de
Campinas (2014). Mestre em Educação, área de concentração: Políticas,
Administração e Sistemas Educacionais, pela mesma Universidade (2009). Graduada
em Pedagogia (2005) e Bacharelado em Administração (1992). Professora da
Faculdade de Educação, na Universidade Estadual de Campinas. Credenciada no
programa de Pós-Graduação em Educação e Coordenadora do Mestrado Profissional
em Educação Escolar. Coordenadora e pesquisadora do GEPEJA (Grupo de Estudos e
Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos) e pesquisadora do GPPES (Grupo de
Pesquisas em Políticas, Educação e Sociedade), ambos da Faculdade de Educação
da UNICAMP e cadastrados junto ao diretório de grupos de pesquisa do CNPq. Tem
experiência na área de Educação, atuando principalmente nos temas de: Educação
de Jovens e Adultos, Paulo Freire e Elza Freire, Formação de professores,
Políticas Públicas, Ditadura e Exílio brasileiro.
O livro está
disponível para compra diretamente com a editora: https://editorapangeia.com.br/product/desmortes/
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