A INCRÍVEL POESIA DE ESTHER ALCÂNTARA | Projeto 8M

fotografia do arquivo pessoal da autora

8M (*)

Mulheres não apenas em março. 
Mulheres em janeiro, fevereiro, maio.
Mulheres a rodo, sem rodeios nem receios.
Mulheres quem somos, quem queremos.
Mulheres que adoramos.
Mulheres de luta, de luto, de foto, de fato.
Mulheres reais, fantasias, eróticas, utópicas.
Mulheres de verdade, identidade, realidade.
Dias mulheres virão, 
mulheres verão,
pra crer, pra valer!
(Nic Cardeal)


Mergulhe na incrível poesia de ESTHER ALCÂNTARA:


DESACATO

A vida vale mais
que um sorriso enquadrado
no porta-retratos
onde você pendura a chave
e se ancora
até ser um delicado
peso de porta

Vale virar a chave
soltar os cabelos
e as mãos 

Porque precisamos
do ato
do desacato

E o maior desacato é viver
apesar de

(* poema publicado em Conexões Atlânticas - Antologia II, p. 88 e no livro Porque em relevo se revelava o verso, p. 93)

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foto/poema do arquivo pessoal da autora 

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OCASO 

Doem-me entrelinhas
que nunca escrevi
espinhos do leitor
que não se adivinha 

goela apertada, sina
entre o humor falido
e o amor esquivo
me dando de quina

Não sou de rinhas
pelas esquinas
e me pensava nua
no caráter das linhas

Sigo a rua, paralela
e enquanto se inverte
a curva do meu sorriso
turvo sol me amarela

(* poema publicado em Conexões Atlânticas - Antologia II, p. 89)

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foto/poema do arquivo pessoal da autor

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LUZIA, PRETÉRITO IMPERFEITO

Consumida e subtraída
de nós
foi nossa memória

luz ia, Luzia, luz ia
para todos
mas apagaram a golpe

nossa ascendência humana
jaz acesa
nas chamas do abandono

Luzia luzia, luzia Luzia
mas virou cinza 
pó de nenhuma lucidez

(* poema publicado na Antologia Comemorativa Dia Internacional da Mulher Mulherio das Letras Portugal - Poesia, p. 66 e no livro Porque em relevo se revelava o verso, p. 31)

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foto/poema do arquivo pessoal da autora 

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PALAVRA CORPO

Não me importa
palavra que se vomita
no breu dos dias

Gosto da palavra
que se ama e namora
essa que destrava

Primeiro trava, dói 
nos cantos da boca
amaro tamarindo

Depois adoça ideias
toma o corpo da gente
espírito letra lânguida

Ideia só vira poesia 
se a palavra toma corpo
num beijo de língua

(* poema publicado na Antologia Comemorativa Dia Internacional da Mulher Mulherio das Letras Portugal - Poesia, p. 67)

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foto/poema do arquivo pessoal da autora 

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LONGILÍNEA

Longa é a linha
onde meu corpo
longilíneo
se aninha

Contorna
um (uni)verso
sanguíneo
por um fio

Verbo a dançar
na carne
pasmada de
silêncios

(* poema publicado na Revista Gueto,  06.03.2020)

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foto/poema do arquivo pessoal da autora 

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ESSAS QUE ME TIRAM O SONO

Parecem vir
de recônditos 
inauditos
embalsamadas
essas palavras 
abelhudas
debulhando asas
que na noite
saltam dos sonhos
em negrito.

Desenho-as
em sombras etéreas 
com lápis de olhos
encantados
como quem pinta
o rosto dos sonhos
em algum ponto
entre a sobrancelha
e o infinito
por viver

(* poema publicado na Colectânea Mulherio das Letras Portugal - Poesia, p. 142)

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foto/poema do arquivo pessoal da autora 

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HABEAS CORPUS

Quis sair
mas só havia
in-concreto
vias de
abscesso

Acessos de
sexta concepção 
por um tris
no cérebro de 
segunda

A vida desanda
convulsa
e grita sonâmbula
o direito a seu
corpus

(* poema publicado na Colectânea Mulherio das Letras Portugal - Poesia, p. 143 e no livro Porque em relevo se revelava o verso, p. 23)

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foto/poema do arquivo pessoal da autora 

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PORQUE EM RELEVO SE REVELAVA O VERSO 

Eu logo vi a palavra
ali suspensa
virgem de(s)composta
sobreposta à pele
tumor de alma exposta
lava in-continente
transparente na verve
carne viva a implorar o hálito
de dragões

Eu logo vi a poesia
indisposta a calar
no verso do corpo

(* poema publicado no livro Porque em relevo se revelava o verso, p. 29)

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capa do livro Porque em relevo se revelava o verso

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Como tantos vivem
fingindo não ver?

Admito que
de barriga cheia
como a fome
e vomito a miséria
em versos 

Não posso calar
e seguir farta
sabendo minha
a falta alheia

(* poema publicado em sua TL do Facebook, 27.10.2021)

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(*) 8M: 8 de Março = Dia Internacional da Mulher: Projeto 'Homenagem a mulheres escritoras/artistas', iniciado em março/2021, por Nic Cardeal.

fotografia do arquivo pessoal da autora 


ESTHER ALCÂNTARA é natural de Monte Aprazível/SP, viveu por muito tempo em São Paulo/SP e atualmente reside em Salvador/BA. É graduada em Letras e especialista em Língua Portuguesa. Poeta, letrista e cronista, seus textos estão publicados em diversas antologias no Brasil e em Portugal. Também participa de sites e de revistas de literatura, como Mallarmargens, Cult, Ruído Manifesto, Escambau, Gueto, Ser MulherArte, entre outras. Trabalha na área editorial há mais de  27 anos - como editora e revisora de textos - e é proprietária da Carpe Librum Editora. Também se dedica à encadernação artesanal e participa de saraus.

Participação em coletâneas/antologias: Conexões Atlânticas - Antologia II (poesia, org. Adriana Mayrinck, In-Finita Lisboa/PT, 2018); A Mulher e o Livro - uma relação em prosa e verso (organizadora e editora, Carpe Librum/2019); Antologia Comemorativa Dia Internacional da Mulher Mulherio das Letras Portugal - Poesia (org. Adriana Mayrinck, In-Finita Lisboa/PT, 2019); Colectânea Mulherio das Letras Portugal - Poesia (org. Adriana Mayrinck, In-Finita Lisboa/PT, 2020); entre outras.

Livros publicados: Raízes (livro de artista participante  da exposição 'Entre a dobra e a obra: memórias', na Biblioteca Mário de Andrade/SP, 2015); Vinte poemas para serem lidos com lupa (minilivro de poesia, 2016);  Piracema (poesia, Carpe Librum/2017); Porque em relevo se revelava o verso (poesia, Carpe Librum/2021).




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