A POESIA MARCANTE DE MARÍLIA KUBOTA | PROJETO 8M

fotografia do arquivo pessoal da autora 


8M (*)

Mulheres não apenas em março. 
Mulheres em janeiro, fevereiro, maio.
Mulheres a rodo, sem rodeios nem receios.
Mulheres quem somos, quem queremos.
Mulheres que adoramos.
Mulheres de luta, de luto, de foto, de fato.
Mulheres reais, fantasias, eróticas, utópicas.
Mulheres de verdade, identidade, realidade.
"Dias mulheres virão", 
mulheres verão,
pra crer, pra valer!
(Nic Cardeal)


Não deixe de ler a poesia  marcante de MARILIA KUBOTA:


ESTE SILÊNCIO

este silêncio
é pra ser ouvido
como quem ouve
um velho amigo

como quem
põe sentido

e repercute
o menor ruído

este silêncio
é pra ser ouvido
contra o motor do avião
e placas de Proibido

pra ser ouvido
como quem anda pra trás
e acha divertido
viver por um triz

este silêncio
é pra ser cortado
por um pé de vento
e súbito cair abatido.

(* poema do livro Esperando as Bárbaras)

capa do livro Esperando as Bárbaras 
-*-


CORES

preto preto preto.
são as unhas sujas
na banca de frutas.

branco branco branco.
o sorriso cúmplice
de manhãs de sol.

preto cinza preto.
a tinta que turva
a lua do poeta.

cinza carmesim.
é a maçã e a sombra
traçadas pelo pincel.

(* poema do livro Esperando as Bárbaras)

imagem do Pinterest 
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LIKE A ROLLING STONE

como ser pedra
que rola no abismo
ser desvario
muitos gostariam
não podem
seguem programas
temem desabe o céu

ser inocente
— uma outra forma
de fazer arte —
pintar a parede

quase tudo
morre
de velhice
ou mesmice

se houver um buraco
para cavar
avise

talvez haja fórmula
para escrever
rimas, x e y,
se você quiser,
mas o que irrompe
é a onda elétrica
além do blablablá

a eloquência
arranca aplauso
cobre o rap soluçado

jogar paciência com cadáver
obedecer ordens não escritas
o raio atinge
em vez de rosa, cacto.

nem santo
nem ator:

o poeta é perdedor.

(* poema do livro Esperando as Bárbaras)

imagem do Pinterest 
-*-


NOTÍCIA

estamos sendo seguidos
perseguidos, controlados,
estamos todos perdidos
achando monstros na rua
enquanto o tempo flutua
lá no alto o sorriso luminoso
num espetáculo estrondoso 
mais uma vez aparece
pra quem jamais agradece

(* poema do livro Diário da vertigem)

capa do livro Diário da Vertigem 
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QUE ME PERCA

que me perca
dentro de bibliotecas
em labirintos de letras
em lábios indo às tontas
beber fonte grotesca

que me perca
no desalinho de linhas
inventando o caminho
como astro sozinho
iluminando a floresta

que me perca 
de qualquer orientação 
de sentido e de razão 
sem violenta emoção 
atirando em toda seta

que me perca 
de tua palavra correta
zanzando como pião 
da multidão de caretas
saboreando este pão

(* poema do livro Diário da Vertigem)

imagem do Pinterest 
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A LOUCA

e não a entendemos,
essa que busca
sóis fora de si.
não a entendemos
como se entende
um figo
ou uma pedra.
interroga a vida mineral,
e os cachorros,
dialogando
com musgos
e um arco-íris
invisível.
nem um mimetismo
a salva.
apenas uma dança
de gestos patéticos
que insiste em retirar nuvens
de garrafas verdes

(* poema do livro Diário da Vertigem)

imagem do Pinterest 
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(*) 8M: 8 de Março = Dia Internacional da Mulher: Projeto 'Homenagem a mulheres escritoras/artistas', iniciado em março/2021, por Nic Cardeal.


MARILIA KUBOTA é natural de Paranaguá/PR, e atualmente reside em Curitiba. É escritora, jornalista e Mestre em Estudos Literários pela UFPR.

É orientadora de oficinas de criação literária desde 2005. Em 2008 organizou o 'Concurso de Haicai Nempuku Saco'. Edita os blogues 'Micropolis' (poesia) e 'MEMAI' (jornal e site de letras e artes japonesas). 

Organizadora das seguintes antologias: Retratos japoneses no Brasil - literatura mestiça (Annablume/2010), que recebeu o Prêmio Nikkei de Literatura em 2011; Blasfêmeas - mulheres de palavra (Casa Verde/2016); e Um girassol nos teus cabelos – poemas para Marielle Franco (Quintal/2018).

Participou das seguintes antologias: Pindorama (Buenos Aires, 2000); Passagens (2002); '8 femmes' (2007); Antologia da poesia brasileira do início do terceiro milênio (Lisboa, 2008); Blablablogue (2009); Todo começo é involuntário  - poesia brasileira no início do século 21 (2011); Fantasma civil (cartões com imagens aéreas de Curitiba e no reverso versos de autores paranaenses, Fundação Cultural de Curitiba/2013); Bicho de siete cabezas (Buenos Aires, 2014); As mulheres poetas na literatura brasileira (org. Rubens Jardim, Arribaçã/2020).

Livros publicados: Selva de sentidos (ÁguaForte Edições/2008); Esperando as Bárbaras (poesia, Blanche/2012); Micropolis (poesia, Lumme/2014); Diário da vertigem (poesia, Patuá/2016); Eu também sou brasileira (crônicas, Lavra/2020); Velas ao vento (poesia, Medusa/2020); Que o só levante (crônicas,  Arribaçã/2023); A voz dos ares (haicais, com Maria Valéria Rezende,  Lavra/2023).







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