PIETÀ - Um conto de Claudia Manzolillo
Michelângelo *Conto retirado do livro premiado pela UBE, A Dona Das Palavras PIETÀ por Cláudia Manzolillo Não sabia quando começara a verter lágrimas grossas, compridas, pesadas. Sabia que de seus olhos antigos brotava um líquido contínuo e doce,e às vezes, salgado como se fosse água do mar. Chorava ou destilava dor? Se parasse, esse fluxo explodiria ou incharia como um balão de gás e se perderia entre as nuvens num voo sem rumo? Não sabia dizer e por isso continuava sua missão: chorar e secar até que o algodão ensopasse e a vida lhe desse uma trégua. Pensava ser impossível ter tanta água em seu corpo esmirrado. Seria um desígnio de Deus condensar em seus olhos essa água sem fim? Deveria pagar alguma promessa esquecida? Reparar algum erro ancestral? Um crime, traição, algo inominável? Por que chorava a mulher? nenhum parto a fizera chorar assim, algum aborto teria rasgado a sua alma a ponto de chorar a vida arrancada? Ou um amor afogado na taça egoísta de um orgasmo soli