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Mostrando postagens com o rótulo Crônicas que as lembranças me embrulham de presente

Crônica | Momentos que somam e dividem, por Chris Herrmann

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| coluna 16 | Momentos que somam e dividem por Chris Herrmann   É incrível como há momentos na vida da gente que, ao mesmo tempo que nos somam e dão muita satisfação, podem nos dividir interiormente.  Foi o que aconteceu comigo na virada de 2017 para 2018 e também três meses depois. Tive uma fase bem difícil e delicada por conta de um tratamento de câncer de mama. Antes do terrível diagnóstico, eu estava toda feliz, planejando o término do meu primeiro romance e uma possível viagem ao Brasil para lançá-lo em três cidades.   Apesar do susto do diagnóstico e as dificuldades enfrentadas no tratamento da doença, posso até dizer que me saí bem. Procurei unir forças para não me deixar deprimir, nem fazer com que a doença me vencesse. Não. Eu a venci com o apoio do avanço da ciência e da medicina, mesmo sabendo que isto só foi possível por conta de um diagnóstico prematuro em um exame de rotina. Mais aliviada, porém um tanto debilitada com as várias sessões de radioterapia, decidi aceitar o c

Crônica | Sobre inclusão e suas pequenas revoluções

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 15 SOBRE INCLUSÃO e suas pequenas revoluções por Chris Herrmann Há 26 anos eu trabalhava em uma empresa no Rio de Janeiro como secretária executiva na diretoria de uma multinacional. Havia uma outra secretária que veio trabalhar conosco “emprestada” de uma firma pequena (brasileira) e foi ficando. Ela era semi-cadeirante e não faltava muito para sua aposentadoria. Poucas vezes tive uma colega de trabalho tão competente, eficiente e gentil. Fizemos amizade. Fui me revoltando a cada dia mais em ver que, pela condição de deficiente física, ela continuava a ser explorada. Nunca recebeu mais que um salário mínimo em quase toda a sua vida. Para resumir, depois de cerca de um ano que ela estava conosco eu intercedi tanto que meu emprego ficou por um fio. Mas não me arrependo um segundo da confusão que causei naquela diretoria. Minha mãe, muito religiosa, rezou para todos os santos para que eu não fosse despedida. E não fui. Tudo se acalmou

Coluna | Meu pai, a ditadura e a esquerda - por Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 14 Meu pai, a ditadura e a esquerda por Chris Herrman n Tive uma infância pobre e nela tive o dissabor de viver nos tempos da ditadura. Meritocracia é uma farsa que só agrada aos hipócritas e aos que se acostumaram com o “jeitinho” das maracutaias. Ser de esquerda não é “ser comunista”, mas ser a favor de mais justiça social. Ser de esquerda não é ser “terrorista”, mas é lutar pela igualdade de oportunidades, não importando se você é preto, branco, pobre, rico, homem, mulher, homossexual, heterossexual, trans, amarelo, índio.  Embora eu tenha nascido em um ambiente humilde de uma família numerosa, meu pai lutou muito para que tivéssemos acesso a uma boa educação. Lutou tanto que esqueceu da própria saúde e morreu aos 52 anos, quando eu tinha 19. Lutou para nos tirar de escolas públicas arbitrárias e nos colocar em escolas sem limitações, mesmo que ele se arrebentasse trabalhando também na estiva à noite, carregan

Crônica | O ódio que não se aprende - Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 14 O ódio que não se aprende Chris Herrmann Minha filha, quando era bem pequena, viu pela primeira vez aqui na Alemanha uma criança negra. Estávamos no parquinho. Segue o diálogo que foi mais ou menos assim: _ mãe, aquela menina tem uma cor diferente.  _ filha, o mundo está cheio de pessoas diferentes, inclusive na cor da pele. _ ela está olhando pra mim. _ deve ser porque você olhou pra ela. _ é mesmo.  _ não quer ir lá brincar com ela? Ela foi correndo e brincaram e ficaram amiguinhas. Ficamos amigos da família também. Nunca mais minha filha fez qualquer menção sobre alguém lhe parecer diferente. Ensinei-a desde cedo a não ter preconceitos e a respeitar as diferenças. Meu filho, idem. Quando ele era criança, inclusive, enfrentou problemas na escola por causa de uns meninos mal educados, por defender uma menina turca de religião muçulmana que estava sofrendo bullying. Ele não aceitou ser mais um da “bo

Das lembranças boas do meu irmão Wilsinho - por Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 13 Das lembranças boas do meu irmão Wilsinho por Chris Herrman n Outubro de 2007. Eu viajei para o Rio sozinha e o Wilsinho foi me esperar no aeroporto todo ansioso e quando me viu abriu um sorrisão. Ele me abraçou tão forte que pensei que meu coração fosse sair pela boca. E o dele também! Foi lindo.  De todos da família e amigos que reencontrei, ele foi quem mais me deu alegria de rever. Queria minha companhia quase o tempo todo e eu a dele. Minha grande amiga e cantora Ilka Vilardo fez um show em minha homenagem para minha despedida com direção de Maria Ceiça (muito chique isso) chamado „Bis bald, Chris“ (em alemão: „Até breve, Chris“) e era em Copa à noite. Wilsinho fez questão de ir. Primeiro, para me prestigiar e, segundo ele, para me proteger porque Copa à noite é muito perigoso. Ele se preocupava muito com a minha segurança de andar sozinha à noite quando eu estava de férias no Rio. E brincava: „v

Crônica | Meia verdade ou meia mentira? - Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 12 Meia verdade ou meia mentira? por Chris Herrmann Naquela época, eu vivia no Rio de Janeiro, tinha 19 anos e meu pai tinha falecido há pouco. Eu estudava Letras na UFRJ durante o dia e procurava trabalho em um horário que não atrapalhasse os meus estudos. A situação financeira da minha mãe estava difícil e, mais ainda, eu sentia a necessidade de trabalhar e ajudar. Já tinha experiência como secretária, com inglês, traduções, datilografia, estenografia e operação de telex nacional e internacional. A dificuldade de encontrar algo que se encaixasse no meu tempo disponível era grande. Por esse motivo, me inscrevi em várias agências de emprego no centro da cidade (nos anos 80 não havia internet para todos, como hoje) e deixava claro que aceitaria também um trabalho temporário. Eu só queria uma chance. Certo dia, recebo uma ligação telefônica de uma dessas agências, e a moça ao telefone disse que se me interessasse, havi

As doçuras e agruras da minha avó - por Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 11 As doçuras e agruras da minha avó por Chris Herrmann Eu ainda era muito nova quando minha avó materna Olga se foi. Mas as lembranças que ela nos deixou são muitas e bem vivas em nós, pelo menos em mim. Vovó Olga teve uma vida muito difícil e dura. Mais ainda depois que se casou com o meu avô, que era um machista de carteirinha e não respeitava as mulheres de forma alguma. Mas eu não sabia, ou pelo menos não compreendia essas coisas na minha infância. Eu gostava dela por ser minha avó, mas ao mesmo tempo, a achava muito durona e exigente com tudo. Gostava mais dela quando colocava a gente pra dormir e contava histórias. Eu ficava fascinada com aquele mundo fantástico que ela nos apresentava. Ela não contava histórias de livros. Tirava tudo da própria imaginação. Ainda me lembro que eu e meus irmãos pedíamos no final: “Ah, vó, só mais uma história, por favor. A gente promete dormir em seguida!“ (risos) Eu só t

As implicâncias doces da minha mãe - por Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 10 As implicâncias doces da minha mãe por Chris Herrmann Minha mãe tinha um humor variável, mas até quando era mau me fazia rir. Ela detestava que eu andasse de roupas pretas (porque eu sempre gostei). Ela nunca teve preconceito de raça, mas de cor preta de roupa! Quando eu ainda vivia no Brasil e era solteira, era uma guerra: „você parece uma viúva! Nem se casou e já quer matar o marido??“ E eu, não dava ouvidos, só ria e continuava a vestir roupas pretas. Nas vezes que ela veio me visitar na Alemanha (foram quatro), a primeira coisa que ela fazia era abrir a porta do meu guarda-roupa e dizer: „você não mudou nada. Que decepção!“ A última vez que ela esteve aqui foi em 2002, para o batizado do meu filho. Fui buscá-la toda feliz no aeroporto e antes de eu abraçá-la, ela disse: „eu só vim pra impedir você de ir ao batizado do meu neto de preto, porque batizado não é enterro!“ Depois me abraçou e rimos muito. Desde

Mãe, por que flores? - Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 09 Mãe, por que flores? por Chris Herrmann Minha mãe adorava flores. De todos os tipos, cores e formas. Queria a nossa casa sempre muito florida e perfumada. Gostava de tecidos de cama, mesa e banho, bem como certos acessórios e objetos decorativos, com motivos igualmente florais. Como artista plástica que era, também não faltaram flores em muitos de seus quadros. Era quase uma mania, embora naquela época eu não me desse tanto conta disso. Toda quarta era dia de feira bem perto de onde morávamos. Ela podia esquecer de comprar qualquer coisa, mas nunca as flores. A maioria ia para o jarro grande que ficava na mesa da sala. Outras para vasos menores. E sempre um botão de rosa solitária e belíssima para a jarrinha estreita. Essa ia geralmente para a mesinha onde ficava o telefone. Eu gostava de observá-la mexendo com as flores e de ajudar, embora ela preferisse fazer esse trabalho prazeroso sozinha. Costumava cantar

Lembranças da Escola Pública na Ditadura - Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me em embrulham de presente - 08 LEMBRANÇAS DA ESCOLA PÚBLICA EM QUE ESTUDEI NO BRASIL DA DITADURA por Chris Herrmann Nasci no Rio de Janeiro nos anos 60 em plena Ditadura Militar no Brasil. Estudei os dois primeiros anos do antigo primário (1a. e 2a. série do fundamental hoje) em uma escola pública no subúrbio.  Foi entre 1970 e 1971. Tudo ali era muito autoritário, arbitrário, mas com louvor “patriótico”. No pátio, ficávamos em forma para cantar o hino nacional antes de começar as aulas todos os dias, enquanto a bandeira do Brasil era hasteada. Ensaiávamos musiquinhas idiotas para tudo, até para a professora entrar em sala de aula. Usávamos um uniforme que eu achava horroroso. Não éramos ensinados a pensar, mas a obedecer. Numa dessas vezes que ficávamos em fileira para cantar o hino nacional, pouco antes um menino violento (a maioria deles era machista) chutou a minha perna e doeu muito. Algumas meninas viram mas ficaram com medo de rea

Até onde as palavras nos levam - Chris Herrmann

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Crônicas que as lembranças me embrulham de presente - 07 Até onde as palavras nos levam  - elocubrações & improvisos por Chris Herrmann Em 1989 passei por uma das situações mais engraçadas, e ao mesmo tempo, mais constrangedoras da minha vida. Participei de um concurso de frases de humor promovido pela Rádio Antena 1, do Rio de Janeiro. Mandei pelo correio cerca de 110 frases no tema proposto ("eu sou do tempo que...") e venci. Ganhei um aparelho de videocassete que eu tanto sonhava. Naquele tempo era novidade e custava caríssimo. Meu companheiro, na época, filho de portugueses, não se importou da frase vencedora ser uma sátira justamente com portugueses! Eu não imaginava (embora desejasse muito) ganhar o concurso, muito menos que aquela frase seria a escolhida. Então, dias depois, num almoço de aniversário na casa da tia dele, toda a família portuguesa estava reunida. Eles me deram os parabéns pelo prêmio e meu companheiro insistiu para eu contar sobre a fra