Postagens

Mostrando postagens com o rótulo Literatura.

Fernanda de Paula e a poesia de sua janela enluarada

Imagem
Letícia de Paula Pôr do sol de outono dói mais.  Mesmo quando  uma imensa alegria me acena  por detrás  de montanhas azuis, essa saudade gorda  faz o  que vejo pela janela vestir um brilho úmido  de  lágrimas. A luz do ocaso é cor sem nome.  Ressoa  grave, em lilás desmaiado,  levemente coberto  de uma poeira vagarosa  de terra vermelha.  A alma acorda sonolenta,  os olhos enfumaçados  de preguiça e canção.  Tudo no entorno é velho  – também minha voz.  Viver parece coisa antiga.  O amor boceja. Letícia de Paula   Com a garganta dormente de tudo que não disse quando podia,  lavo o peito da saudade.  Costumava colher florinhas amarelas no mato. Só, por detrás das encostas da imaginação, observava uma velha  plantadora de árvores no meio do deserto. Pensava o que aquela mulher  de tez engruvinhada de histórias tanto escondia no chão,  as mãos de desenterrar sonhos...  Com que leveza d’alma ela regava  as

Das Águas - crônica de Nic Cardeal

Imagem
DAS ÁGUAS (Nic Cardeal) Quando comecei a escrever não era bem a palavra o que eu procurava. Eu queria mesmo era devorar  minhas próprias entranhas, buscando algum sentido. Precisava encontrar sentido. Lembro que naquele tempo o tempo era mais longo, mais esticado sobre os dias. A gente conseguia alcançar mergulhos mais fundos. Havia mais água por dentro. Lá naquele azul profundo, quase noite eterna de tão profundo, eu cavoucava, quase sem ar, à procura de sentido. Às vezes acordava bem no meio da madrugada, abria os olhos e 'inda era muito escuro, muito fundo, nos meus mergulhos, lá nas minhas águas de dentro, no avesso dos meus mundos. Às vezes a água era tanta, que me transbordava olhos afora, e eu - a alma - não resistia a trancafiar minhas janelas. Eu precisava de sentido. O tempo sempre foi um cara muito esquisito. Empurrava-me adiante, muitas vezes a contragosto, repetindo anos a fio, que era melhor eu deixar pra lá a ideia de sentido para o caminho. Mas eu insistia